quarta-feira, 1 de outubro de 2014

CHEGA DE SER USADO PELOS “DONOS” DA POLÍTICA


Você tem certeza que todos os seus amigos sabem mesmo votar?
Não estou falando de orientar na escolha de nomes de candidatos, embora isso seja importante.
Não falo aqui de como escolher o nome para presidente, governador ou senador que pode melhor representar o interesse de cada um.
Embora muita gente não saiba como isso funciona, mas a explicação é muito fácil. A mais simples é a eleição de senador. Entre todos os candidatos, é eleito o que tem mais votos.
Para presidente e governador, é exigida a maioria absoluta. Quer dizer, um candidato ganha se tem mais da metade de todos os votos válidos no primeiro turno. Voto válido é aquele dado a algum candidato, ou seja, tirados os brancos e nulos. Se nenhum tem mais da metade (mais que a soma de todos os outros candidatos), haverá um segundo turno entre os dois mais votados e ganhará o que tiver maior votação.
Quase todo mundo já aprendeu essas lições.
Mais difícil é entender as eleições proporcionais, para deputados federais e estaduais (distritais, no caso do Distrito Federal).
Pior, quem não sabe como é essa eleição tem sérias dificuldades para uma escolha consciente do seu candidato.
A não ser que se trate de um eleitor estritamente partidário, aquele para quem não importa quem será eleito, desde que seja do seu partido. Afinal, o voto é proporcional, o que significa dizer que as vagas serão distribuídas entre os partidos na proporção mais exata possível do que seja a sua votação.
Os eleitores da época lembram que o PT, quando surgiu, praticamente não pedia votos para os seus candidatos. A propaganda se resumia a VOTE PT. E o número 13.
Porque é assim que funciona. Não importa se o eleitor votou em um candidato ou no número do partido. Tudo é somado e as vagas são distribuídas entre os partidos.
Por isso, o eleitor mais ingênuo é aquele que garante: “Eu não voto em partido, eu voto no candidato”. Nem desconfia o quanto está enganado. Poderá até chegar um pouco perto da verdade se ele der muita sorte e o seu candidato for um dos mais votados de seu partido. E, claro, o partido ganhar vagas suficientes para que ele seja incluído.
Até muitos dos candidatos mais inocentes só vão perceber durante a campanha que entraram em uma arapuca.
Uma amiga que mora no Rio me ligou há alguns dias para ver se eu podia ajudar o seu candidato. Como moro em Brasília, imaginou que poderia advertir a direção nacional do partido dele sobre o que se passava.
Ela e seu candidato descobriram que ele estava sendo traído justamente por seu partido!
Parece mentira? Pois eu asseguro que pelo menos dois terços dos candidatos passam por essa situação.
A campanha já começara oficialmente há cerca de vinte dias. O pobre candidato (deputado estadual) recebera do partido não mais que três cavaletes (três!) e, na véspera, aparecera pela primeira vez na TV. Durante míseros 8 segundos. E minha amiga injuriada porque recebia apoio muito maior outro candidato da mesma legenda e que disputa voto na mesma região.
Essa amiga tem especial interesse na eleição de seu candidato por causa do apoio que ele dá ao seu trabalho social em uma área carente do Rio. Mesmo sem ela o dizer abertamente, os dois começaram a perceber que a candidatura dele não é pra valer.
Um candidato desses é tido por seu partido como na verdade uma espécie de cabo eleitoral. Sua votação só servirá para viabilizar a eleição dos candidatos protegidos pela direção partidária.
COMO SE DÁ A CONSTRUÇÃO DA CHAPA DE UM DESSES PARTIDOS?
Dá pra considerar como exceções os partidos ideológicos: PT, PCdoB, PSol, PSTU, PCO e PCB.
Nos demais, as direções são como verdadeiros “donos” dos partidos, que conhecem as regras e se valem delas para garantir a eleição dos nomes previamente escolhidos para ganhar.
O número de vagas a que um partido tem direito no sistema proporcional é calculado pela divisão do total de votos válidos pelo número de vagas.
Veja um exemplo. São eleitos 8 deputados federais e 24 distritais no Distrito Federal. Imagine um total dos eleitores presentes que não votam branco ou nulo igual a 1,8 milhão. Cada partido só elegerá deputado distrital se alcançar no mínimo 75 mil votos. São somados os votos de todos os seus candidatos e mais os de eleitores que votem apenas no número do partido. Para conquistar uma vaga de deputado federal terá que somar pelo menos 225 mil votos. É o que se chama quociente eleitoral.
O que se fala no meio político local é que os quocientes serão de 60 mil e 180 mil votos, o que significa uma previsão de cerca de 1.440.000 votos válidos.
Daí, divide-se o total de votos de cada partido pelo quociente eleitoral. O resultado é a quantidade de vagas a que tem direito, o chamado quociente partidário.
Complicado? Só o suficiente para ser compreendido pelo chefe político e fundir a cabeça do eleitor.
O chefe político sabe quem quer eleger. Avalia o seu potencial eleitoral e calcula o quanto falta para atingir o quociente eleitoral. Então, trata de conseguir nomes que somem o suficiente de votos para chegar a esse patamar. Claro que não abrirá espaços para quem possa ultrapassar o seu candidato do peito. Ao longo da campanha, vai injetando recursos nos que podem ajudar mais. Se alguém ameaça ultrapassar o seu preferido, é só reduzir o apoio em estrutura, materiais, recursos financeiros, exposição na TV.
Pra confundir ainda mais a cabeça do eleitor desavisado, existem as coligações, que são tratadas durante as eleições como se fossem partidos. E raríssimos eleitores sabem como os partidos estão organizados nas coligações. Até porque a absurda legislação brasileira permite que as coligações de deputados estaduais (distritais) sejam diferentes das de federais e também das de governadores. E todas essas são diferentes das organizadas para apoiar um candidato a presidente.
Veja alguns exemplos. O PDT apoia Dilma Rousseff, do PT. Mas não apoia Agnelo, o candidato do PT a governador. O PPL apoia Agnelo, do PT. Mas não apoia Dilma Rousseff. A coligação do PT brasiliense para deputado federal tem também PRB, PCdoB, PP, PSC e PROS. Mas para deputado distrital a coligação é somente de PT e PP. O PCdoB, por exemplo, está coligado para deputado distrital com PPL e PTN.
Mas dá pra complicar as regras ainda mais. Quantos candidatos o partido pode lançar?
Vai depender se há mais de 20 deputados federais ou menos. Pode lançar o dobro do número de vagas se tem menos de 20 deputados federais e uma vez e meia se tem mais do que isso. Mas a coligação pode lançar duas vezes as vagas nos estados de maiores bancadas e até o triplo nos menores, como é o caso do DF.
Isoladamente ou em coligações, o Distrito Federal tem 9 chapas concorrendo a deputados federais. Para deputados distritais, são 19.
Conclusão: é feito de tudo para tratar o eleitor como um idiota, sem ter a menor condição de fazer uma escolha consciente. Resultado, o pobre escolhe um nome e pensa que está votando nele, mas está na verdade elegendo o preferido da direção do partido que o lançou. No caso do DF, é possível dizer que, antes da decisão, o eleitor não ideológico considera a possibilidade de votar em pelo menos quatro nomes para deputado distrital: alguém que conheceu no trabalho ou na escola, uma pessoa da mesma igreja, um vizinho, o amigo de um parente ou o parente de um amigo, entre tantas outras razões.
Dificilmente avalia se esse ou aquele concorrente tem alguma chance. Jamais lhe passa na cabeça que o seu voto não será desperdiçado se seu candidato não se eleger. Será aproveitado para eleger um dos mais votados do partido ou da coligação.
Até aqui, algum leitor atento talvez já esteja convencido de que é indispensável uma reforma política, que os políticos tradicionais e os “donos” da política fazem de tudo para evitar.
É POSSÍVEL VOTAR COM CONSCIÊNCIA?
Ficou assustado? Digo que não se desespere. É possível ter um mínimo de consciência na hora de escolher seu candidato. Mas vai lhe tomar alguns minutos de estudo e reflexão. Eu acho que vale a pena. Melhor que ficar se queixando da política e não ter contribuído para um resultado melhor. E melhor que virar joguete nas mãos dos espertos.
Dê um drible nos “donos” dos partidos e será menor o risco de se queixar da política depois.
Vamos voltar à análise da “construção” da chapa?
Veja o partido dos nomes em que pensou em votar. Sei que não é fácil, pois eles normalmente escondem os partidos, não os mostrando na propaganda. Geralmente, só os partidos ideológicos abrem o jogo. O partido está nos dois primeiros algarismos do número do candidato. Recorra aos portais de busca da internet (Cade, Altavista, Google, Bing) e encontrará o número de cada partido. Procure ver qual a coligação daquele partido. Lá, encontrará os nomes de todos os candidatos. Você verá que há nomes mais conhecidos, que mais aparecem nos programas de TV do partido, que têm mais material, mais presença de campanha. Se o seu não está no meio, desconfie das chances dele. Ele pode ter sido posto na chapa somente para somar votos para os preferidos. Tente chutar uma média de votos para cada candidato do grupo e veja se a soma chega naqueles 60 mil (ou 75 mil) votos. Se achar que não vai atingir isso, séria chance de não se eleger ninguém da chapa.
Em alguns casos, a análise é muito simples. Pra não cometer injustiça, o PCO lançou somente um concorrente para deputado federal e outro para distrital. Você acha que, sozinhos, terão essa votação?
Olhei a coligação formada por PDT, PSB, PSD e Solidariedade para deputados federais. Pelos nomes que estão lá, não consegui acreditar que somem 180 mil (ou 225 mil) votos. Se chegarem a isso, posso apostar que há dois nomes favoritos e, estranhamente, nenhum é do partido do candidato a governador (PSB), que lançou 10 nomes, ou do pretendente ao Senado (PDT), que tem 11 inscritos. Tenho razoável dose de certeza que não há chances fora dos nomes de Rogério Rosso (PSD) ou Augusto Carvalho (Solidariedade). Os demais estão ali para pôr areia no caminhão deles. Senão o que explicaria esses 21 políticos verem o candidato a governador aparecer na TV pedindo voto para Augusto e não para algum membro de seu próprio partido?
Este não é um método preciso. Afinal, os caras foram muito espertos na hora de pensarem as regras, fazendo de tudo para impedirem os eleitores de terem uma participação decisiva.
Mas já dá para se aproximar bastante da realidade na hora de escolher.
Se fizer um estudo um pouco mais cuidadoso vai ver que não há realmente 954 candidatos a deputados distritais no Distrito Federal. No máximo, as 24 vagas da Câmara Legislativa estão sendo disputadas por 50 nomes. Com muito boa vontade. As 8 vagas de deputados federais também não estão ao alcance dos 150 inscritos na eleição, mas a um grupo que não passa de 15 a 20 concorrentes.
Essa situação, com números diferentes, repete-se em todos os estados do País.
Fernando Tolentino

3 comentários:

  1. Caramba, eu tinha pouca instrução sobre isso. Quanta gente está vontando sem conhecimento daquilo que está a fazer. Parabéns Tolentino.

    ResponderExcluir
  2. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  3. É um belo texto Dr.Tolentino, sm duvidas fique sabendo um pouco mais sobre o mundo da politica, onde muitos falam, mais na verdade poucos o conhece, parabéns e obrigada por me dá a chance de lê e me informar cada vez mais!!!
    Beijo!

    ResponderExcluir