quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

O ORGASMO QUE CIRENEU CERTAMENTE MELARIA


O ano de 2013 se aproximava do ocaso quando rebentou o orgasmo simultâneo de certa mídia e seus amigos magistrados. Não o orgasmo espontâneo, mas o que é fruto de iniciativas combinadas ou, pelo menos, de uma conjunção de vontades tal que levaria qualquer relacionamento ao ideal da realização suprema.
Foi assim que justamente o dia 15 de novembro serviu para que a mais alta corte de justiça (desculpem o termo) desdenhasse dos valores republicanos.
Uma vez condenados, tratou-se que os petistas José Dirceu e José Genoíno, mais Delúbio Soares, fossem enviados para o cárcere. Não pareceu interessante que cumprissem suas penas em São Paulo, cidade em que residiam com suas famílias (Goiânia no caso de Delúbio), talvez por algum outro detalhe não menos malévolo. Provavelmente porque ficaria ainda mais injustificável deslocar os condenados do segmento empresarial para a capital paulista, fazendo-os ali cumprirem as suas penas, e seria imperdível para as câmeras de TV a cinematográfica cena de serem enfiados juntos no xadrez, os petistas e os agenciadores dos recursos que teriam servido à “corrupção”. Ou haveria outro motivo para que se determinasse imediato cumprimento de pena para os políticos petistas e não para os vinculados a outros partidos?
Não deu tempo para se cumprir trâmites burocráticos. Mas quem vai ligar para burocracia numa hora dessas? Tanto que o titular da Vara de Execuções Penais de Brasília foi esquecido, sendo acionado em seu lugar o substituto, por sinal filho de um dirigente brasiliense do PSDB. Sabe-se que a mídia (ou parte dela) tomou conhecimento da ação antes mesmo das autoridades policiais e judiciárias.
Todos devemos convir que um orgasmo dessa envergadura não pode simplesmente ficar apenas na lembrança.
Embora ainda adviessem furtivos (mas não menos excitantes) encontros do casal, presumia-se encerrada a relação a partir do início do cumprimento da pena dos petistas. O componente sádico do orgasmo não permitiria isso e se iniciou a fase onanista diante dos gestos do parceiro.
Pretos, prostitutas e pobres perderam a exclusividade do cumprimento de penas, passando a dividi-la com o outro “P”, o de petistas. Mais que isso, de esquecidos da mídia foram transformados em referências e os direitos que lhe eram antes negados (não raro suas condições carcerárias vistas como privilégios, do tipo “casa, comida e ócio”) passaram a ser objeto de comiseração de jornalistas subitamente ganhos para os direitos humanos. Alguns deles (ou seus advogados, antes tidos como “portas de cadeia”) ganharam até voz, desde para que protestarem contra os direitos atribuídos aos petistas, por mínimos que eles sejam.
A administração carcerária foi praticamente obrigada a revogar a decisão de que a visita aos presos da Ação Penal 470 se desse em dias distintos da dos demais presos, uma atitude que visava a evitar o tumulto advindo das presenças simultâneas de autoridades.
Garimpa-se um preso tetraplégico (que jamais foi lembrado por qualquer que fosse o meio de comunicação) para comparar com as condições de saúde de Genoíno, saído pouco antes de complicada cirurgia cardíaca, após a qual, não bastassem os cuidados requeridos, revelou sucessivas crises hipertensivas.
Os presos são confinados em regime fechado, ainda que as condenações tenham sido para regime semiaberto. José Dirceu acabou abrindo mão de emprego que lhe asseguraria o regime adequado diante da pressão dessa mídia, inconformada com a concessão do direito. Primeiro, fez acintosa chacota do salário oferecido. Era alto? Sim, embora aquém do de deputado federal ou de ministro da corte que lhe condenou. De nada adiantou o proprietário do hotel informar sobre a defasagem com relação ao de outro gerente, esclarecendo que este recebe comissão sobre a atividade, o que não seria o caso de Dirceu. O seu possível empregador acabou denunciado por negócios em paraíso fiscal, como se um empregado pudesse ser culpado por atividades do empregador. Também não adiantou a revelação de que essas atividades fossem comuns a grupos empresariais que mantêm veículos de comunicação. O que realmente importava era a ameaça velada a quantos arriscassem oferecer emprego ao petista. Agora, com nova oferta e em valor muito abaixo do que o mercado lhe reservaria em condições normais, Dirceu aguarda pacientemente que a autoridade (sob a perversa fiscalização midiática) se digne a despachar seu processo.
Por último (por enquanto), chega a absurda notícia de que não é autorizada à prática da leitura aos presos petistas por mais de duas horas por dia! Aquela mídia – a mesma que tão contritamente lembra a todos a importância de preservarem o “espírito de Natal” – comemora mais essa decisão.
Ponho-me a imaginar que falta não deve ter feito a Caifaz uma mídia ativa, econômica e tecnologicamente capacitada e principalmente hegemônica. O que faria essa mídia com o Cireneu caso já existisse no momento da agonia de Jesus e o surpreendesse levantando a sua cruz?!
Fernando Tolentino


quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

AÉCIO NÃO ESTÁ ERRADO

Quando Aécio Neves se insurge raivosamente contra o encaminhamento à Polícia Federal, pelo ministro da Justiça, de documentos reveladores do envolvimento de importantes tucanos paulistas com no cartel do metrô, o máximo que se pode questionar é que o rapaz está mal acostumado.
Realmente, como se poderia exigir dele que aceitasse com naturalidade, ainda não a apuração, mas sequer a perspectiva de que isso venha a ocorrer?
Já não fosse o aprendizado, com o exemplo e a orientação do avô de que, se são irrefutáveis as provas, diga que são falsas, não ocorre ao moço qualquer precedente significativo de apuração de irregularidades em que políticos a ele ligados estivessem envolvidos. Cedo aprendeu com os correligionários paulistas que CPIs foram instituídas para investigar adversários. Bom observador, viu que Procurador Geral da República tinha o mesmo compromisso que as CPIs. Não seria a Polícia Federal que fugiria a regra.
A mídia, no duplo governo tucano de Fernando Henrique, limitou-se a ilustrar capas e manchetes isoladas com fatos que seriam escândalos em quaisquer outros governos e jamais foram além de alguns dias de repercussão. Só o necessário para confirmar a crença popular de que “não vai dar em nada mesmo”. Isso no governo federal. Nos governos estaduais do PSDB, nem pensar.
O rapaz viu sepultada uma sucessão de casos que transformariam em meliante qualquer líder petista acaso os sinais fossem trocados e os governos fossem liderados pelo PT. Como sempre, de que importam as provas? Que sejam convenientemente esquecidas. Furnas, Banestado, compra de votos para a reeleição, privatizações graciosas de estatais, a aquisição das ambulâncias. Não houve caso que deixaria de virar fumaça ou sumisse na portentosa gaveta do Senhor Procurador.
Ao ver o ministro José Eduardo Cardozo encaminhar à Polícia Federal provas contra correligionários, o senador deve ter tomado um susto. De um lado, a reação natural de oligarca: “Quem esse cara pensa que é? Ele não sabe de quem está falando?” Quase deixaria escapar: “Ele por acaso está pensando que essas provas atingem petistas?” De outro, a atitude racional, a constatação de que seria indispensável impedir o início da apuração, lancetar o tumor antes de intumescer a ponto de explodir pus para todos os lados. Para isso, a melhor tática, aquela conhecida por qualquer torcedor de futebol: a melhor defesa é o ataque. No melhor estilo recomendado pelo ídolo e avô. Jogada de risco. Nem o tradicional agressor Álvaro Dias quis emprestar sua voz. Mas teria a seu favor a repercussão na grande mídia, tanta que só assim apareceu, com exuberância, a escabrosa história do “trensalão”.  
Como o documento chegou às mãos do ministro por meio do deputado estadual Simão Pedro (PT), pressiona-se para obter de Cardozo nada mais do que, como ele mesmo diz, prevaricação.
Diante de deputados e senadores, o ministro hoje repetiu que tudo será apurado. Para isso, o País conta com uma Polícia Federal profissionalizada e agora com total independência para efetuar suas investigações.
Indícios há e são tão sérios que a Suíça está fazendo todo o esforço possível para chegar à verdade. Inclusive apelando para o apoio do governo brasileiro. Não se trata de alguém simplesmente batendo a carteira de um transeunte distraído. O promotor Marcelo Milani diz que os trens foram reformados a preços compatíveis com os de composições novas, em alguns contratos não houve competição e o superfaturamento nos dez contratos apurados atingiu R$ 875 milhões. Para que se tenha um ideia, praticamente 16 vezes o valor do chamado "mensalão". O processo se iniciou há 20 anos e perdurou em sucessivos governos tucanos de São Paulo. Se a grande mídia acha pouco e resolve não dar destaque ao fato, até tornando-o menor que a suposta partidarização no envio das provas para apuração, é outro problema. O Brasil já se acostumou com isso.
A Polícia Federal é que simplesmente não poder deixar de averiguar tudo o que de fato ocorreu e não interessa a que nomes chegará. Se forem tucanos, caro Aécio, você só terá que lastimar ao concluir que, ao menos de um lado da Praça dos Três Poderes, as coisas mudaram.
Fernando Tolentino