terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A BLOGUEIRA CUBANA E O FRACASSO DA DIPLOMACIA DA DESINTEGRAÇÃO



Beto Almeida
A gira da blogueira cubana Yoani Sanchez pelo Brasil, tem se revelado, até o momento uma exitosa campanha de over exposição midiática dela, uma frágil tentativa de distorcer a gigantesca função histórica libertadora da Revolução Cubana e, também, numa fracassada operação da diplomacia da desintegração. Trata-se de uma ação geopolítica da direita para tentar impedir a crescente presença política de Cuba na América Latina e Caribe por meio de vários projetos de cooperação, mas sobretudo, pela criação da CELAC – Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, da qual Cuba é hoje presidente. Para isto, foram derrotados, pelos povos da região, todos os esforços da agressiva política dos EUA para isolar a ilha caribenha. Começo por reivindicar 1% do espaço midiático dado a ela, para discutir este outro ponto de vista.
Era previsível que a blogueira tivesse ampla cobertura da mídia. Cobertura marcada pela repetição de uma única tese e, na proporção inversa, pela negativa em informar sobre o que é exatamente a realidade de Cuba, a começar pela informação de que Cuba exerce a presidência da Celac. Isto, para um país que foi bloqueado, expulso da OEA, atacado militarmente pelos EUA, impedido de ter acesso pleno ao sistema financeiro internacional, representa, fundamentalmente, uma vitória de Cuba e da causa da integração latino-americana e caribenha. Obviamente, representa um fracasso de todos os países imperiais, de seus meios de comunicação e de personagens como Yoani Sanches, que, observa que seu discurso é de absoluta sintonia com os polos mais conservadores da sociedade brasileira, discurso que tem sido derrotado. O discurso dela e da mídia brasileira que o exalta, é o discurso que quer o fracasso da política externa brasileira de prioridade à integração com a América Latina.
Biotecnologia: avanço técnico-científico
Seria muito informativo e educativo para o povo brasileiro se, na mesma proporção do oferecido à blogueira, também fosse dado espaço midiático aos cientistas cubanos para falar como um país pobre, em pouco mais de 50 anos de Revolucão, e sob bloqueio, conseguiu desenvolver uma indústria de biotecnologia das mais avançadas do mundo, com medicamentos de eficácia comprovada e sucesso internacional como o Óleo de Schostakovsky ( para a gastrite), o complexo para combater diabetes, a vacina contra o câncer de intestino (um laboratório dos EUA tentou comprar mas foi proibido pelo governo Bush), as vacinas contra a meningite, etc. Antes da Revolução, Cuba sequer possuía indústria farmacêutica; hoje exporta medicamentos, ciência, e médicos.

Países imperiais exportam soldados, armas, intervenções militares... Esta mesma mídia brasileira que é sócia da SIP (Sociedade Interamericana de Imprensa, apoiadora de todas as ditaduras da região), também fez um grande estardalhaço para tentar impedir que o Brasil reatasse relações com Cuba em 1986, sob o Governo Sarney. Na época, o Brasil teve um surto de meningite e esta mesma mídia, que fez uma acirrada campanha para que o Brasil não comprasse as vacinas cubanas contra a meningite. Uma operação econômica e ideológica.
No primeiro caso, o Brasil tinha e ainda tem o seu setor de medicamentos quase totalmente controlado e ocupado por umas poucas multinacionais farmacêuticas, grandes anunciantes desta mídia, ambos lutando para não perder o controle do mercado para as vacinas cubanas, que o governo Sarney acabou importando em grande quantidade, apesar da pressão dos oligopólios. E era também uma operação ideológica, com a intenção de dizer que era impossível que uma ilha pequenina, cercada de hostilidades imperiais por todos os lados, pudesse, com poucos anos de socialização de sua economia, ter alcançado tal êxito técnico-científico, a ponto de transformar-se em exportadora de sofisticados medicamentos, enquanto o Brasil, uma economia muitas vezes superior, era ainda dependente de sua importação.
Sarney e as vacinas cubanas.
A ruidosa campanha contra as vacinas cubanas na época – questionando até sua eficácia terapêutica, apesar dos reconhecimentos da Organização Mundial da Saúde - era uma desumana tentativa de intimidar o governo Sarney que, não apenas reatou com Cuba, mas começou a realizar um processo de intercâmbio comercial, científico e cultural com a Ilha. Vale citar, o ministro da Cultura de Sarney era o inesquecível Celso Furtado... O discurso da mídia então, submisso aos ditames imperiais, queria também impedir a criação do Mercosul, cujo fortalecimento posterior e sua consolidação hoje, é algo que desagrada enormemente aos inimigos da integração, pois é evidente que um Mercosul cada vez mais forte e amplo, com a entrada da Venezuela e, proximamente, da Bolívia e do Equador, representa uma alternativa histórica real aos “Cem Anos de Solidão” de uma América Latina antes submissa e desunida e, agora, em processo de transformação , com governos populares e com uma cooperação cada vez maior com Cuba. Estamos abrindo as páginas dos Cem Anos de Cooperação...
Desintegração e fracasso histórico
É este processo de integração crescente o alvo da passagem da blogueira por aqui e deste ponto de vista, revela-se um enorme fracasso Ela se auto classificou como diplomata popular, mas é fácil perceber tratar-se de uma diplomata da desintegração. Como pano de fundo, o que ela e seus patrocinadores visam é obstaculizar a causa maior de nossas mais importantes lideranças históricas, a começar por Simon Bolívar, José Marti, Tiradentes, Abreu e Lima, Perón, Getúlio Vargas, Che Guevara, hoje continuados, concretamente, pelas políticas de integração implementadas pelos governos de Lula-Dilma, Fidel-Raul, Hugo Chávez, Evo Morales, Pepe Mujica, Nestor e Cristina Kirchner, Daniel Ortega e o recém reeleito Rafael Correa.
Dalai Lama
Personagens como Yoani Sanches são criados em determinados momentos, recebem as condições materiais e financeiras de circulação, publicidade e exaltação, mas produzem, concretamente, poucos resultados práticos. Citemos outro personagem fabricado para uma operação similar contra a Revolução Chinesa: Dalai Lama. Sustentado por anos e anos pelo Departamento de Estado dos EUA, que além do salário lhe garante o apartamento onde vive perto do Central Park de Nova York, e de uma jorrante publicação de seus livros, Dalai Lama revela-se um retumbante fracasso. Antes da Revolucão Chinesa, o Tibet era um regime feudal e escravocrata. O Brasil não foi o último país a abolir a escravidão, foi o Tibet, e por meio de uma revolução dirigida por Mao-Tse Tung e o Partido Comunista. Antes da vitória socialista, em 1949, a China era conhecida pela espantosa fome que levava milhões à morte a cada ano.
Além disso, havia todo tipo de doenças evitáveis, o povo sequer conhecia médicos. E era possível, nas feiras, comprar animais e mulheres como servas, já que não existiam direitos trabalhistas. Hoje, apesar das inúmeras giras de Dalai Lama pelo mundo, a China é conhecida por lançar uma nave tripulada ao espaço sideral, por ser a economia que mais cresce no mundo, que mais fabrica computadores e turbinas de energia solar, que lança satélites em parcerias com a Venezuela e o Brasil, que legalizou e socializou a acupuntura (antes de Mao era proibida) e que, em parceria com a Rússia e o Iran, está travando os planos da Otan de invadir e esquartejar a Síria. O que se houve falar de Dalai? A notícia mais recente é que ele estaria disposto a dialogar com as autoridades chinesas, contrariando seus patrocinadores. Vai ter que mudar-se do Central Park...
Cuba inclusiva?
A blogueira falou em Brasília que quer uma Cuba mais inclusiva e plural. Se examinarmos a realidade cubana, especialmente as estatísticas elaboradas ou reconhecidas por instituições internacionais como a Organização Mundial da Saúde, a Unesco, a Unicef, a Organizaçao Panamericana de Saúde e se a mídia comercial, que tanta exalta a Yoanis, desse ao povo brasileiro o direito de conhecê-las, ficaria claro que é difícil apontar uma sociedade tão inclusiva como a cubana. A começar porque não existem nela crianças vagando pelas ruas, crianças fora da escola, crianças pedindo esmolas, nem crianças trabalhando.

A taxa de mortalidade infantil é INFERIOR àquela registrada nos EUA, onde, aliás, o trabalho infantil está em elevação, o que se agravou enormemente com o desemprego e a crise capitalista por lá, onde só os banqueiros e a indústria bélica foram salvos, como revela o Occupy Wall Street. Não há um único hospital privado em Cuba, todo o atendimento é gratuito. Isto não é inclusão? Inclusive para os bombeiros e sobreviventes que trabalharam nas operações de resgate de corpos dos escombros das Torres Gêmeas, demolidas providencialmente pelos autoatentados de 11 de setembro de 2001, em Nova York. Estes bombeiros e sobreviventes, cidadãos norte-americanos, foram levados a Cuba pelo cineasta Michel Moore, pois não tinham planos de saúde nem tratamento médico nos EUA, embora tivessem sido condecorados com heróis. Em Cuba, foram atendidos gratuitamente nos hospitais mais avançados, os mesmos que já trataram, depois da eleição de Chávez, um total de 43 mil cidadãos venezuelanos. Se a blogueira tivesse visitado hospitais no Entorno de Brasília, teria uma ideia concreta do que é realmente a falta de inclusão...
Aliás, se o povo brasileiro pudesse ser informado, massivamente - digamos quecom 10 % do que a TV Globo mostra de baixarias do Big Brother, onde há z até edificantes concursos de pum - sobre um único relatório da UNICEF em que se afirma que “Existem 200 milhões de crianças desnutridas no mundo hoje. Nenhuma delas é cubana!”, entenderia mais claramente os absurdos ditos por esta personagem.
Bloqueio
Houve um tempo em que os opositores de Cuba, inclusive a blogueira, diziam que o bloqueio dos EUA era apenas uma desculpa de Fidel para desviar a atenção dos problemas internos. Agora, quando o bloqueio recebe múltiplas condenações na ONU, sendo defendido apenas pelos EUA, e por razões óbvias de subordinação pelo Canadá, Israel e uma ilha desconhecida do Pacífico, sendo criticado, até mesmo, pelo New York Times e pela Revista Forbes, a blogueira, foi orientada a mudar o discurso e já admite ser contrária a esta escandalosa violação dos direitos humanos do povo Cuba por parte da Casa Branca, proibindo à ilha uma simples operação comercial para a compra de aspirinas no mercado norte-americano.
Aliás, ela disse também ser a favor da libertação dos 5 heróis cubanos prisioneiros políticos nos EUA, por trabalharem na prevenção de atentados terroristas organizados em território da pátria de Jack London. Alertado por Fidel Castro, em carta entregue pelo genial Gabriel Garcia Marques, o presidente Bill Clinton, ao invés de fazer uso das informações para evitar atentados terroristas que estavam e organização, como os de Oklahoma ou os de 11 de setembro de 2001, preferiu... prender os cinco cidadãos cubanos.
Agora que até a blogueira já fala no fim do bloqueio, dando razão ao governo de Cuba, e também a Lula e Dilma que sempre se pronunciam em defesa da posição do governo cubano, vale comparar a situação vivida por Yoani Sanchez - que não está presa, comunica-se com o mundo inteiro a partir de Cuba ou fora dela, viajando por mais de 12 países para criticar a Revolução Cubana - com a situação do soldado norte-americano Bradley Manning, preso e torturado em prisão militar dos EUA, por ter revelado ao mundo, corajosa e generosamente, com a ajuda do Wikeleaks, os documentos sigilosos contendo os planos mais sinistros do imperialismo para atacar e desestabilizar vários países e governos ao redor do mundo. Ou comparar com a situação de Mumia Abu Jamal, jornalista e militante negro, preso no Corredor da Morte nos EUA, condenado injustamente por um juiz racista que coleciona sentenças de pena de morte especialmente para negros, asiáticos, hispânicos e pobres que vivem por lá. O “delito” de Abu Jamal é escrever com coragem e talento sobre o regime discricionário vigente nos EUA, onde, há pouco, foi proibida a sintonia por satélite de canais de TV do Irã, desmascarando-se, assim, o falso discurso da liberdade de expressão reivindicado pela Casa Branca. Bom, eles já haviam proibido o ingresso de Charles Chaplin por lá...
Medicina e humanismo
Tive a oportunidade de visitar a Escola Latino Americana de Medicina (ELAM), instalada numa antiga base naval desativada próximo a Havana e lá conversei com representantes dos mais de 500 estudantes negros estadunidenses, oriundos dos bairros pobres do Harlen ou do Brooklin. Eles me contaram que jamais teriam a oportunidade de se formarem em medicina nos EUA, sendo muito mais provável, pelas condições precárias de vida que tinham lá, que fossem recrutados pelo narcotráfico e terminassem presos. Ou mortos na juventude. Aliás, os EUA possuem a maior população carcerária do mundo... Em Cuba, estes jovens estão estudando, gratuitamente, para serem médicos.
Compartilhar o que tem, não o que sobra
Ante aos agressivos ataques do Pentágono e da Cia contra a Revolução Cubana, esta se defende, legitimamente, mas também reage com humanismo, oferecendo aos filhos pobres da pátria de Lincoln a possibilidade de escapar da criminalidade e servirem socialmente ao povo norte-americano, a quem se respeita em Cuba, a ponto que jamais se queimou uma bandeira dos EUA em território cubano. Enquanto a Casa Branca envia terroristas e guerra bacteriológica contra Cuba – como denunciou um ex-ministro da saúde dos EUA – Cuba envia médicos formados para o povo norte-americano! É a este país, que reparte seus modestos recursos orçamentários com outros povos, que a blogueira acusa de não ser inclusivo?
Vale lembrar o desastre do Furacão Katrina: enquanto a população negra e pobre estava abandonada em Nova Orleans, pelo governo de Bush, Cuba ofereceu o envio imediato de 1200 médicos para salvar vidas ali. Eles ficaram toda uma manhã posicionados no aeroporto de Havana esperando autorização da Casa Branca para embarcarem para os EUA. A autorização nunca veio. E a blogueira, que reivindica uma Cuba inclusiva, não toca no tema.
Cuba plural?
Houve um ano, 1984, em que a Unesco reconheceu ter Cuba batido um recorde na publicação de livros, que lá são vendidos a preços de um picolé ou menos. Foram 48 milhões de exemplares publicados naquele ano. Entre estas obras há Guimarães Rosa, com tiragem superior a 150 mil exemplares, quando no Brasil, com um indústria gráfica 50% ociosa, a tiragem padrão é de apenas 3 mil exemplares. Em Cuba há o mais amplo acesso à literatura universal, ao cinema internacional, o cinema é uma atividade popular, com ingressos baratos e salas cheias. Já foi produzida em Cuba uma rádio-novela sobre a Coluna Prestes, quando aqui ainda não há sequer projetos para uma grande produção cinematográfica sobre o tema.
Como seria educativo se a presidenta do Instituto do Livro Cubano, Zuleika Romay, uma mulher negra e jovem, pudesse ter 5% do espaço televisivo que foi dado à blogueira para desprestigiar a Cuba, inclusive quando afirmou que concordaria com hospitais e escolas privadas na Ilha, o que revela seu pensamento nada inclusivo. Serviços privados só são acessíveis a quem paga, e na Cuba atacada pela mídia conservadora, a educação e a saúde são públicas e gratuitas. Milton Nascimento, numa turnê pela Ilha, sentiu-se mal e foi atendido por médicos em seu hotel. Ao final, quis pagar, recebendo como resposta que em Cuba saúde é um direito de todos e que isto não se vende.
Cuba, Brasil e Haiti
Quando a tragédia do terremoto assolou o Haiti - um geólogo cubano havia alertado, anos antes, que eram altíssimas as probabilidades de um terremoto com epicentro cerca de Porto Príncipe - os médicos cubanos já eram responsáveis há anos, praticamente, pelo o que havia restado de serviço de saúde ali ante tanta miséria construída pelos países imperiais que dão sustentação à blogueira. O Brasil também estava lá, com o maior número de soldados, que também realizam obras de infraestrutura. Mas, a partir do terremoto Brasil e Cuba passaram a colaborar mais centralmente na área da saúde, e, com um financiamento de 80 milhões de dólares do governo brasileiro, foram construídas instalações de saúde para o povo haitiano, no qual trabalham as centenas de cubanos que já estavam lá há anos, juntamente com médicos militares brasileiros. Como parte desta cooperação, além da saúde, o Batalhão de Engenharia do Exército está construindo a única hidrelétrica por lá, além de rodovias e pontes.
Impublicável: cooperação sul-sul-sul
Em 2006, a Organização Mundial da Saúde, lançou um SOS Internacional: precisava de produção massiva, a preços baixos, de vacina contra meningite A e C para entregar a 23 países da África, onde vivem 430 milhões de seres humanos. Só uma empresa transnacional fabricava estas vacinas, mas devido à baixa lucratividade, reduziu sua fabricação colocando a África sob o risco de emergência sanitária. Só dois laboratórios públicos atenderam ao chamado da OMS: Instituto Finlay de Cuba e o Instituto Bio-Manguinhos do Brasil. Os dois se associaram para a criação da vacina Vax-MEN-AC, específica para os tipos de meningite que afetam a África. A cooperação Brasil-Cuba permitiu um preço 20 vezes menor do praticado pela transnacional e já foram produzidas e entregues 19 milhões de doses.
Esta é uma notícia impublicável nos grandes meios que abrem todo espaço à blogueira e que hiper divulgam as ações financiadas pela Fundação do Multibilionário Bill Gates, de impacto mínimo, conduzidas por operações de marketing de empresas privadas, aquelas que não se interessaram em atender ao apelo da OMS. Brasil e Cuba, com governos de orientação de esquerda, por meio de laboratórios públicos, fazem mais contra a meningite na África que as transnacionais e a fortuna de Bill Gates. A blogueira não fala nada disso no seu blog, nem nas suas entrevistas, mas pede uma Cuba mais inclusiva e plural.
Cuba, Brasil e Timor Leste
Em visita de trabalho ao Timor Leste, onde a TV Cidade Livre de Brasília e o Comitê de Brasiliense de Solidariedade ao Timor doaram os equipamentos de uma rádio comunitária às organizações educacionais locais, pude visitar, também, o alojamento de 400 médicos cubanos que lá trabalham em solidariedade ao povo maubere. Comentei a visita com o Presidente da República, Ramos-Horta, Prêmio Nobel da Paz, que recebia o Presidente Lula. Ele me contou que ter sido pressionado pelo Embaixador dos EUA lá a não receber os médicos de Cuba, oportunidade em que perguntou ao gringo: “Quantos médicos norte-americanos temos aqui?”. “Só um, o da embaixada!”, respondeu. “Pois então o povo do Timor é muito grato a Cuba e vai sim receber os médicos cubanos”, disse-lhe Horta.
O pensamento da blogueira é bastante sintonizado com o do embaixador gringo e certamente não considera inclusivo que na cooperação Brasil e Cuba, os 600 estudantes timorenses que serão formados em medicina na Ilha brevemente, antes de voltar ao Timor, façam estágio na Fundação Oswaldo Cruz, no Brasil, na área de medicina tropical.
Como se sabe, a cooperação não fica por aí. O Brasil está estudando a contratação de um numeroso contingente de médicos cubanos para, finalmente, levar serviços médicos a todos os municípios brasileiros, o que ainda não ocorre. Isso sem falar dos cerca 800 brasileiros, em sua maioria pobre, inclusive, uma centena de jovens do MST, que lá estão estudando medicina. Gratuitamente, pois Cuba, desde o início de sua Revolução, compartilha com outros povos não apenas o que lhe sobra, mas o que tem.
Complexo de Mariel: integração para todos crescerem
Não é casual que a blogueira tenha iniciado sua gira pelo Brasil, país que tem participação decisiva no mais importante projeto de infraestrutura em construção em Cuba hoje, o Complexo de Mariel. Será o maior porto de todo o Caribe, dinamizando a economia de toda a região, além contar com uma ferrovia, uma rodovia e uma mineradora. Os empréstimos do BNDES são da ordem de 1,2 bilhão de dólares. Desnecessário afirmar que, na prática significa, também, furar o bloqueio dos EUA contra Cuba, indicando apurada visão estratégica de Lula, e, além disso, uma ideia clara do que significa uma integração para que todos os países possam crescer juntos, reduzindo as assimetrias e comprovando a política de que só por meio da integração da América Latina e Caribe é possível constituir uma área alternativa de crescimento com distribuição de renda. A blogueira está na contramão deste projeto e é por isso que foi tratada como um troféu pela mídia oposicionista - e por seus seguidores - que tem visto este projeto ser derrotado nas urnas repetidas vezes, como recentemente no Equador, na Venezuela e na Bolívia, que recém nacionalizou os serviços portuários ante a negativa de investimentos de transnacionais espanholas.
Mandela: devemos o fim do apartheid a Cuba
Foram ouvidos muitos disparates durante a gira da blogueira no Brasil. Algumas manifestações normais e democráticas de jovens e estudantes contra sua presença, foram tratadas como se fossem violentas. Nenhum país é mais criticado no fluxo informativo internacional do que Cuba. Mas, o problema não são as críticas, elas são permitidas até à própria blogueira. A questão é a violência com que sempre foi tratada a Revolução Cubana desde o início pelo imperialismo, sendo obrigada a pagar um preço amargo, com muitas vidas ceifadas em atentados terroristas como o que derrubou o Avião da Cubana de Aviación, sendo seus autores confessos protegidos pelos governos dos EUA. Que também protege a blogueira.
Mas, entre todos os disparates, o mais surpreendente foi contorcionismo analítico de um editorialista do Estadão que chegou a fazer uma comparação, meio envergonhada é bem verdade, de Yoani Sanchez com Nelson Mandela. Diante do nível desta tentativa absurda de analogia, uma resposta grande com uma página da História. Cuba enviou cerca de 350 mil homens em mulheres para lutar em Angola em defesa da independência do país, invadido pelo exército racista da África do Sul, contando com o apoio dos EUA e com a oferta de Israel para que fosse atirada uma bomba nuclear sobre as tropas cubano-angolanas. A solidariedade cubana escreveu uma página inapagável na história moderna: Cuba foi o único povo a pegar em armas para lutar contra o apartheid, o mais brutal e criminoso regime político-social dos tempos modernos! Quando ocorre a vitória sobre as tropas racistas na Batalha de Cuito Cuanavale, Mandela, ao livrar-se dos 27 anos de prisão, cunhou uma frase que define com a energia de um raio, a função histórica de Cuba: “ A Batalha de Cuito Cuanavale foi o começo do fim do Apartheid. Devemos isto a Cuba”.
Diante dos ataques da mídia contra Cuba, Dilma , em Havana, reagiu apontando os telhados de vidro dos que querem ser campeões em direitos humanos mas mantém um centro de torturas em Guantânamo e multiplica o assassinato de civis, inclusive crianças, por meio de seus drones macabros. Enquanto isto, o Brasil segue aprofundando sua cooperação com Cuba e consolidando a integração solidária e democrática por meio do Mercosul, da Unasul e da Celac, presidida por Cuba, com sua generosidade e humanismo, e sem a presença arrogante e imperial dos EUA. A diplomata da desintegração, aqui no Brasil, está fadada ao fracasso.
Beto Almeida é jornalista, membro da Junta Diretiva da Telesur. Publicado em Carta Maior em 23/02/2013

domingo, 10 de fevereiro de 2013

UMA DATA PARA MUITA FESTA



São 33 anos.
Como todos os partidos, o PT perdeu e ganhou militantes ao longo desse tempo. Perdeu militantes apaixonados, mas ganhou uma multidão de novos filiados.
Cresceu e amadureceu, chegou à Presidência da República e ao governo de vários estados e municípios brasileiros.
Deixou de ser, assim, um partido que existia apenas no movimento social. Um partido forte nos sindicatos, nas comunidades eclesiais de base, no movimento estudantil, nas lutas da sociedade.
Mas fora do poder real. Detendo apenas a condição de denunciar os problemas e pressionar por mudanças.
Paradoxalmente, foi justamente essa a razão para a perda de muitos militantes, companheiros que não imaginavam o PT governando. Até queriam que ganhasse eleições e lutaram denodadamente por isso. Uns até 1989, quando o PT disputou as eleições em aliança com o PCdoB e o PSB, já na época havendo quem se repugnasse com tal abertura. Outros iniciaram o afastamento quando, em 1884, a aliança se ampliou e Lula teve a companhia de Leonel Brizola na chapa. Nova leva de desfiliações na disputa de 1998, várias em estados que candidatos petistas passavam a governar. Eram companheiros honestos, muitos deles socialistas sinceros.  Mas preferiam o PT refém de amplas maiorias parlamentares conservadoras. No governo, mas sem governar. No entanto, puro!
Essa legião de ex-petistas questionava se valia a pena o Partido curvar-se às circunstâncias da realidade para conseguir governar. Muitos não aceitavam alianças, mesmo no campo da esquerda, por verem perspectivas diferentes nos partidos que se agregaram às nossas candidaturas. Um vez nos governos, enojavam-se com a presença de outras legendas nas coalizões que se formavam para garantir a chamada governabilidade.
Quando Lula ganhou em 2002, ficou atravessada na garganta de muita gente a aliança que viabilizou a vitória. A presença no palanque de políticos fortemente identificados com o passado e propostas reacionárias. O mais emblemático foi José Sarney, um oligarca que controla o Maranhão como capitania de sua família e resiste a mudanças em sua realidade.
A verdade é que o ex-presidente da Arena e do PDS não aderiu a Lula como uma mera escolha. Antes, foi para isso empurrado pelo candidato tucano José Serra, quando esse tramou contra a candidatura da filha do oligarca maranhense, Roseane Sarney, que despontava com ares de triunfante no segmento conservador do eleitorado, ameaçando com isso os sonhos de Serra.
Embora confesse que não gostei do cheiro daquela aliança e tenha clareza de que, na coalizão de apoio a Lula, Sarney jamais esteve entre os que empurravam o governo para o avanço e sempre foi extremamente cioso de espaços no Executivo, o certo é que apoiou Lula na campanha da reeleição, manteve-se ao seu lado nos dois mandatos e repetiu o gesto com Dilma Rousseff. Mais: puxou boa parte de seu partido (e até outras forças conservadoras para a base de apoio) e contribuiu para alinhar forças pemedebistas estaduais.
Em 2002, os nossos companheiros não torceram o nariz somente para Sarney. Não foi fácil engolir José de Alencar, um empresários filiado ao PL, como candidato a vice-presidente. A história, no entanto, mostrou que ele esteve em muitos momentos entre os que forçavam os avanços, não raro como posições mais progressistas que partidos e políticos identificados como de esquerda.
Alinho-me entre os que, no início do primeiro governo Lula, preferiam uma aliança com o movimento social e lamentam o relativo distanciamento com relação a essa força, que é íntima de nossa história, até colocando-se em nível secundário várias de suas principais reivindicações, como a reforma agrária. Vejo também no caráter de nossas companhias a postergação – muito além da conveniência e da necessidade – de avanços fundamentais (e agora comprovadamente inadiáveis) como as reformas política e tributária.
Mas a verdade é que o PT, mesmo governando sem ter efetivamente o poder, ou seja, com os limites impostos por nosso sistema político e o nível de politização ainda incipiente de grande parte da população, conseguiu ter a liderança do processo.
Impôs inúmeras conquistas pelas quais lutava desde a sua criação, deixando claro para a população quais as diferenças concretas de governos liderados pelo Partido dos Trabalhadores.
Isso é o que salta aos olhos com a emancipação da miséria de milhões de famílias brasileiras, com a transferência real de renda causada pelo aumento do salário mínimo, dos salários dos demais trabalhadores e proventos de aposentadorias e pensões, com a distribuição quase universal de energia elétrica, com o PROUNI, o Minha Casa, Minha Vida, a Bolsa Família e tantos outros programas sociais de amplo alcance. Mas também com a criação do Prodeb ou a de universidades e descentralização dos seus campi, instituindo o acesso a cursos superiores onde antes isso nem sequer era um sonho, a criação também de diversas escolas técnicas, o retorno da produção naval no País, o reforço da agricultura familiar, a baixa significativa (e definitiva) da taxa de juros e, principalmente, o uso do sistema público de crédito para forçar também que caíssem os juros na ponta do processo. E mais o que há! 
Em 2012, ao ver o governo Dilma criar o programa Brasil Carinhoso, me questionei por que precisava parcelar o pagamento do Imposto de Renda. Havia pouco que lera sobre o movimento de grandes empresários europeus que, no início da crise que insiste em perdurar, propunham aumento de impostos para os ricos. Mesmo não sendo um deles (nem pretenda sê-lo) achei que, revelando merecer concretamente a minha confiança, poderia perfeitamente antecipar as parcelas e ver o governo fazer o que eu faria, na forma de caridade, caso adiasse o pagamento. 
Conseguiu mais ainda. Unir-se a vários países do mundo (especialmente da América Latina) que talvez não conseguissem manter governos progressistas sem a solidariedade concreta do Brasil.
Aliás, no campo internacional, basta lembrar que a Alca era tida como inevitável no momento da primeira posse de Lula. Ou que o FMI era o real governo da política econômica do País. O Brasil – com Lula e, agora, Dilma – deixou a condição de país periférico e absolutamente dependente para figurar como protagonista das grandes decisões mundiais.
Estamos ainda muito longe do socialismo com que sonhei desde a adolescência, mas nunca imaginei que estava lutando por algo de que eu próprio desfrutaria e, com o PT, não estamos marchando em direção oposta, para o atraso. Vejo alcançadas muitas das conquistas pela quais lutei. E já antevejo novos avanços. Sinto-me recompensado por militar nesse partido.
Devo parabenizar o PT, mais sinto que é o caso de cumprimentar a maioria do povo brasileiros e os povos explorados de todo o mundo. 

Fernando Tolentino