segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

AJUDE ITAMAR A COMPRAR OUTRO FUSCA #VAITERFUSCA




Sempre digo que se puder escolher entre comprar um carro usado de uma pessoa humilde ou de uma rica optarei pela primeira. Esse ponto de vista saiu reforçado durante os contatos que fiz com Itamar Santos, 55, serralheiro, residente na zona Sul de São Paulo, quem, no sábado (25 de janeiro), teve seu fusca 1975 incendiado na avenida Consolação por manifestantes que protestavam contra a realização da Copa de 2014 no Brasil.
O episódio tomou conta das redes sociais no dia seguinte (domingo, 26). Adeptos da tática black bloc e críticos de manifestantes que a utilizam se conflagraram virtualmente.
Os adeptos da tática black bloc trataram logo de tentar se defender desse crime que foi cometido dizendo que Itamar, “por sua conta e risco”, avançou sobre a barricada “oficial” que esse “movimento” plantou na via pública, como se fosse um crime tentar escapar de uma situação que pôs em pânico as duas mulheres e a criança de quatro anos que levava consigo no carro…
E que poderia ter matado a todos, caso o fusca tivesse explodido – e só Deus sabe por que não explodiu.
Detalhe: a vítima nega. Itamar diz que não seria louco de atravessar uma barricada em chamas e que acha que os black blocs incendiaram e jogaram o colchão em chamas sob seu carro quando tentou ultrapassar a barricada, pois a fizeram justamente para impedir que carros passassem.
Outra versão que os manifestantes começaram a espalhar na internet é a de que não foram eles que tocaram fogo no carro de Itamar, mas o “Estado brasileiro” por não atender a todas as demandas sociais de um país que tem tantas, o que parece uma bela justificativa para quem quiser delinquir – foi pego cometendo crime? Culpe o Estado.
Antes de prosseguir, quero relatar que fiquei emocionado ao ver o homem se justificando, dizendo que não deu entrevistas à imprensa em busca de que lhe doassem dinheiro. Tive que lhe dizer que ninguém cogitaria tal coisa e que ele não tem o que justificar, pois é vítima.
Seja como for, lancei no Facebook, no domingo, uma ideia que várias pessoas já cogitavam: fazer uma campanha de arrecadação de fundos para Itamar comprar outro carro, pois ele precisa do veículo para trabalhar. Nem vinte minutos após lançar a ideia, centenas de pessoas, no Facebook, no Twitter e até neste Blog se dispuseram a colaborar.
Ora, um fusca 1975 deve custar quanto? No máximo, algo ao redor de uns 5 ou 7 mil reais. Se cada uma dessas pessoas doar 30, 50, 100 reais, arrecadaremos essa quantia – ou mais – em questão de um dia ou dois, se tanto. E se arrecadarmos mais, que fique para Itamar comprar um carro mais novo. Até como reparação pelos danos morais e materiais que sofreu.
Para evitar que se tenha intermediários nessa campanha, optei por meramente pedir a Itamar o número de sua conta e quem quiser colaborar deposita o dinheiro direto na fonte. Abaixo, os dados para depósito.

BANCO ITAU

AGÊNCIA 6733

CONTA 07524-3

ITAMAR SANTOS

Mais do que doar, ajude a difundir esta campanha. Envie por Twitter, Facebook, compartilhe este post com quem puder. A causa é nobre. Prometo colocar aqui a foto do carro novo de Itamar. Assista, abaixo, a entrevista que fiz com ele.

Eduardo Guimarães, publicado no Blog da Cidadania em 27 de janeiro de 2014

Entrevista do Senhor Itamar com Eduardo Guimarães 

domingo, 26 de janeiro de 2014

GENOÍNO, DELÚBIO, DIRCEU, JOÃO PAULO E ITAMAR NÃO SERÃO ABANDONADOS



A foto é do abraço ao acampamento da Trincheira da Resistência, 
montado junto ao STF,  em Brasília, quando se completaram 30 dias 
em que os presos petistas eram mantidos em regime fechado,
 ao contrário do que determina a condenação deles. 
Depois de intensa chuva, o abraço foi ornamentado por um belo arco-íris.
 
Ao assumir a Presidência, após o "impeachment" de Fernando Collor, Itamar Franco expôs a sua velha paixão pelo fusca, sendo a Volkswagen estimulada a relançar o modelo no mercado brasileiro, claro que numa versão incrementada.
O fusca e Itamar voltaram ao noticiário neste fim de semana, mas a história é completamente diferente. Não se trata de um vice-presidente subitamente alçada à Chefia do Poder Executivo. Longe disso. E o pobre fusca, ao contrário do relançamento, é personagem de uma das cenas mais perversas da farsa interpretada por mascarados que, a mando sabe-se lá de quem, tentaram insuflar toda a sorte de descontentes para - em nome de um inconformismo com os investimentos feitos para o Brasil sediar a Copa do Mundo de futebol - gerar manifestações contra o governo de Dilma Rousseff.
Incapazes de atrair a população, os tais arruaceiros travestidos de manifestantes resolveram ocupar as generosas manchetes de meios de comunicação com a destruição de bens públicos e privados. Quer dizer, pretendendo começar os protestos de 2014 por onde terminaram os de 2013.
Não satisfeitos com vitrines de lojas e agências bancárias, veículos da guarda municipal paulistana e abrigos de ônibus, entre outros objetos, voltaram-se contra carros particulares. E atearam fogo, justamente ao pobre fusca de um serralheiro chamado Itamar que voltava da igreja com a sua família. Enquanto o trabalhador cuidava de salvar os passageiros, inclusive uma criança de quatro anos, o seu carro se consumia nas chamas. O fusca que, nos dias de trabalho, o serralheiro usava para fazer as suas entregas. Com isso, fica claro de que lado da luta de classes estão os mascarados.
Pois, por volta das 18 horas, o blogueiro Eduardo Guimarães lançou no Facebook o que definiu como "uma ideia genial", a de "uma campanha para arrecadar fundos para comprar outro fusca para o serralheiro que teve o seu incendiado pelos black blocs". Estimou que contribuições de R$ 30 seriam suficientes caso houvesse a adesão de umas 200 pessoas. À noite, Guimarães já conseguira identificar o serralheiro e obtivera o apoio de pelo menos 300 participantes para a campanha. Nessa progressão, o número tende a superar o de baderneiros que quase feriram de morte a atividade profissional do serralheiro Itamar. Viva! Ainda hoje Itamar pode sonhar com a retomada do seu trabalho, pois Eduardo vai procurá-lo e informar do sucesso da campanha, de que ainda sequer tem notícia.
O nariz de cera deste texto vem a calhar para mostrar os dois lados de uma quase guerra.
De um lado, os que não se conformam com a construção de um processo de inclusão social iniciado com a eleição de Lula, em 2002, e que promete engrenar a quarta marcha com a reeleição de Dilma, em outubro próximo, assegurando um período contínuo de pelo menos 16 anos. As formas dessa luta são variadas e podem se traduzir em vandalismo criminoso misturado com tentativas de empolgar massas de insatisfeitos. Podem também, como temos visto, aparecer na campanha para desqualificar a força política que lidera esse projeto de nova sociedade, passando à sociedade a falsa ideia de que se trata de gente desonesta e, mais que isso, os únicos desonestos da política nacional. Foi o que se viu no julgamento da AP 470 e na sua fabulosa cobertura jornalística e se vê na leniência da condução (e da cobertura de imprensa) de processos judiciais envolvendo os seus adversários.
Do lado oposto, estão os comprometidos com a novidade política representada pelos governos Lula e Dilma. A sua força revela aspectos absolutamente imprevisíveis. É essa gente que se solidariza com o pobre serralheiro Itamar, a um chamado de um blogueiro que sequer tem filiação partidária, e em poucas horas dá uma resposta tão significativa à barbárie dos destruidores black blocs.
Foi essa gente também que proporcionou uma experiência sem precedentes na história política brasileira e muito provavelmente do mundo. Contestando as razões das condenações de líderes importantes do seu projeto político, que pretendem ver revertidas com a comprovação da inocência deles, tomam nas mãos a responsabilidade de pagar a multa imposta a José Genoíno, ex-presidente do PT. E, no curtíssimo prazo de dez dias, juntando contribuições de milhares de pessoas, reuniram não somente o exorbitante valor determinado pelo tribunal, de R$ 667.513,92, mas R$ 761.962,60. Ou seja, já praticamente permitindo que, após pagas as despesas necessárias para a realização da campanha, a família de Genoíno participe de uma nova campanha para assumir as multas dos demais condenados petistas.
A próxima multa a ser paga é a de Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT. Está fixada em R$ 466.888,90. Até o fechamento deste texto já se contabiliza R$ 108.061,37.
Quero dizer que não conheço pessoalmente Delúbio. Diferente de José Genoíno, a quem aprendi a respeitar muito antes de militar no PT. Ele era admirado por servidores da Câmara Federal (inclusive os vinculados a deputados dos mais diversos partidos), por todos os jornalistas com os quais privei, pelos terceirizados e pelos parlamentares (também de todos os partidos). A admiração e o respeito deviam-se justamente à seriedade, à honestidade e ao tratamento respeitoso dispensado a todos. Nenhum tribunal de exceção vai manchar essa reputação.
Além disso, nas relações internas do PT (partido em que milito), nunca tive proximidade com a corrente integrada por ele. Isso quer dizer que não teria o meu voto para chegar à direção nacional do Partido. Nada disso interessa, já contribuí para o pagamento da multa de Delúbio, como contribuirei na campanha para a reposição do fusca de Itamar.
Ambos foram vítimas de injustiças inomináveis. Os dois estão sofrendo por estarem no mesmo lado da luta em que estou. Vítimas dos mesmos algozes.
No caso de Delúbio, como de Genoíno, de José Dirceu, de João Paulo Cunha, muito mais do que isso. Estamos ombreados no mesmo projeto. O de resgatar, da sua situação de exclusão, setores da sociedade que sempre viveram as mesmas dificuldades de Itamar, quando não condições de miséria tais que sequer se aproximam do nível de vida do serralheiro.
Esse projeto não será interrompido. E não o será porque a maioria da população brasileira já entendeu que ele deve continuar e porque tem ao seu lado pessoas que não se afastarão dos companheiros condenados. Temos clareza que eles pagam as nossas penas, a punição por lutar para construir uma sociedade diferente daquela em que fomos criados. Já estão pagando com a prisão. Deixem as multas por nossa conta.
Convido todos os que estão solidários com a construção dessa nova sociedade a se juntarem nessa campanha.
Fernando Tolentino

sábado, 25 de janeiro de 2014

25 DE JANEIRO DE 1984, UMA PÁGINA INESQUECÍVEL DE NOSSA HISTÓRIA




Hoje não é um dia qualquer ao menos na lembrança de quem está com pelo menos 40 anos. Lembra um momento que jamais desaparecerá da História Política do Brasil.
O ano de 1984 apenas começava, mas já se sentia certa inquietude nos meios políticos. Para nós, militantes de esquerda e da resistência democrática, vislumbrava-se uma fresta de luz na esperança de fecharmos definitivamente o período de ditadura que insistia em se impor, manipulando toda a sorte de instrumentos. Do apoio de grande parte da mídia hegemônica à manipulação de casuísmos eleitorais, da manutenção de amplos bolsões de votos conservadores à propaganda ou à repressão pura e simples aos movimentos de contestação.
Havia dois motivos para esse fio de esperança. Sentia-se na camada urbana das cidades, em um país já fortemente urbanizado, que não se suportava mais a ditadura. E, finalmente, os grupos e partidos políticos progressistas e comprometidos com a democracia, com raras e insignificantes exceções, articularam-se taticamente em torno de uma meta, o que não se verificava desde a luta pela anistia.
Recém-eleito pelo PMDB do Mato Grosso, em 1982, o deputado Dante de Oliveira resolvera apresentar uma Proposta de Emenda à Constituição reinstituindo eleições diretas para presidente da República. Novato – e talvez ainda despretensioso na sua iniciativa – chegou a receber assinaturas de jornalistas, seguranças e outros funcionários do Legislativo ao coletar as de deputados e senadores que precisava para alcançar o número mínimo para dar entrada na proposição. Sua emenda acabaria sendo a meta desse acordo suprapartidário e estuário das memoráveis mobilizações políticas de 1984, trinta anos atrás.
A campanha das “Diretas Já” inovou do ponto de vista de organização política no Brasil. Por sua grandeza, acabou abrindo um imenso espaço para a criatividade, mas a sua concepção não foi improvisada. Os publicitários entenderam que o primeiro momento deveria ser no que definem como uma praça de testes. O Brasil tem duas grandes cidades com tal característica: Brasília e Curitiba. Brasília por ser uma espécie de síntese do País e Curitiba pela semelhança de sua sociedade com a de São Paulo. A receptividade de produtos pode ser, portanto, testada nessas duas cidades sem serem queimadas com um lançamento global. A “Boca Maldita”, em Curitiba, foi escolhida como cenário de teste. O comício, realizado em 12 de janeiro, atraiu cerca de 40 mil pessoas. O sucesso da campanha estava assegurado.
Jornalistas e então militantes do PCdoB, eu e Moacyr de Oliveira Filho, o Moa, resolvemos participar do grande comício marcado para São Paulo, em 25 de janeiro, data em que se comemora o aniversário da cidade. Meus filhos mais velhos – Iuri e Miliane – já viviam em Salvador e estavam passando férias comigo, em Brasília. Resolvi levar Iuri, o mais velho, então com 11 anos.
Embarcamos à noite e chegamos a São Paulo na madrugada. Moa é paulistano, de modo que não haveria a menor dificuldade para nos orientarmos. Fizemos uma visita breve à sua família, dali fomos à sede do PCdoB e chegamos cedo à Praça da Sé. No caminho, a ansiedade aumentava a cada minuto ao vermos grandes grupos se deslocando pelas ruas, a pé. Levavam suas próprias faixas e muitos haviam confeccionado camisetas alusivas ao evento. Ao chegarmos, só havia militantes de partidos políticos. Já tínhamos tido uma ideia de como se daria isso quando passamos pelo PCdoB. Todos os partidos, inclusive os ainda clandestinos, tinham certeza de viver um momento histórico e queriam deixar suas marcas para a eternidade. Era preciso ocupar lugares destacados, em que as bandeiras, símbolos e faixas aparecessem nas fotografias.
Essa sadia disputa por evidência, uma emulação que contribuía para a mobilização popular, ajudou também a criar o clima de festa da democracia, quando a Praça da Sé explodiu de participação, com não menos de 300 mil pessoas.
A organização e as dimensões do comício eram impressionantes. O palanque tomava toda a frente da Igreja e tinha uma altura entre 5 e 8 metros. Nele, várias dezenas de artistas, comunicadores, políticos, sindicalistas surgiam junto ao conhecido narrador esportivo Osmar Santos, que fazia a apresentação, ou às lideranças dos partidos oposicionistas: Ulysses Guimarães e Tancredo Neves (PMDB), Luís Inácio Lula da Silva (PT), Leonel Brizola (PDT), além do então governador de São Paulo, Franco Montoro.
A multidão se amontoava para identificar os seus ídolos e se deslumbrar com a aparição deles. Iuri assinalava a presença de cada celebridade. “Olhe, pai, Chico Buarque”, “Fernanda Montenegro, pai”, “aquele é Paulinho da Viola”. E desfiava, um a um, aquela gente famosa: Fafá de Belém, Milton Nascimento, Carlos Zara, Bete Mendes, Bruna Lombardi... 
Cada uma das personalidades famosas deixava claro o seu apoio àquela luta. Cada música era uma convocação a cerrar fileiras para exigir a eleição direta para presidente. Os grandes nomes da política brasileira discursavam nesse sentido e manifestavam a confiança de que, mesmo com a maioria governista, seria possível obter a vitória das diretas se a multidão enchesse as ruas do País.
O povo respondia entusiasmado, alternando palavras de ordem propostas pelo próprio Osmar Santos, pelos partidos ou por grupos que as levavam ou criavam na própria praça. O grande grito de guerra: “1, 2, 3, 4, 5 mil; queremos eleger o presidente do Brasil!”
A saída da Praça da Sé era ainda um momento de incontrolável emoção para aquela gente. Na estação ou no metrô, desconhecidos se congratulavam, alguns tinham lágrimas nos olhos, havia quem puxasse palavras de ordem dentro dos vagões, outros riam sem parar. Todos comentavam, exultantes, sobre o que presenciaram, não faltava quem observasse que estavam escrevendo, nas ruas, uma nova história para o Brasil. Ditadura, nunca mais!
Já de volta à rodoviária, esperávamos o horário da saída do ônibus para Brasília quando começou, nas televisões instaladas no local, o noticiário local da TV Globo. Aguardávamos ansiosamente as imagens daquela grande festa democrática. De repente, lá estava a imagem do palanque: Lula, Brizola, Ulysses, Tancredo, Osmar Santos, Montoro, várias celebridades da cultura e das artes. E o apresentador dizia que, na Praça da Sé, políticos de expressão nacional e grande número de artistas haviam participado, diante de grande público, de uma festa pelo aniversário de São Paulo. É impossível refletir a revolta das pessoas que ouviam aquilo. 
De volta a Brasília, já em casa, Iuri contava excitadíssimo: “Contei quase quarenta artistas famosos!” E citava um a um: Martinho da Vila, Elba Ramalho, Raul Cortez, Dina Sfat, Irene Ravache, Ziraldo, Lucélia Santos, Christiane Torloni...
Ouvi uma das primeiras repreensões que recebi, como pai, e que continuo ouvindo até hoje, pois jamais fui perdoado. Miliane não entendeu que havia razões de segurança – inclusive por não se poder prever como reagiriam as forças da ditadura – quando escolhi a companhia do filho, um pouco mais velho. Ou a maior facilidade, para um pai, de lidar com a companhia de um menino, ao virar duas noites em ônibus e passar um dia inteiro em uma cidade diferente, sem acesso a banheiros e outras comodidades. Nem notava que a empolgação do irmão com a presença das celebridades, como a de todo o povo presente, não anulava o envolvimento com a significação política do comício, que deve lhe acompanhar até hoje.  “Está vendo, meu pai? Você preferiu levar Iuri do que eu, que sou muito mais politizada.” Com apenas dez anos, Miliane questionava sua sensação de exclusão, denunciando que o irmão prestara mais atenção aos artistas que à importância política do comício.
Fernando Tolentino