terça-feira, 8 de outubro de 2013

MARINA ATIROU EM DILMA E...



Fernando Tolentino

A novela da disputa de Marina Silva à Presidência da República pela organização que se intitularia Rede Sustentabilidade chegou ao fim, mas o tema continua dominando as manchetes dos principais jornais brasileiros e os mais nobres espaços na TV e no rádio.
Antes do fim, o gancho era a luta para a agremiação regularizar-se na Justiça Eleitoral e, a partir daí, dar suporte à candidatura presidencial de Marina. Surgiram até insinuações de, especificamente no caso da Rede, não se deveria exigir o cumprimento da norma legal. O esperneio não conseguiu esconder que a Rede, em si, não tem qualquer significação social ou política, tanto que a sociedade lhe negou assinaturas suficientes para o registro. O PSD e, antes, o Democratas conseguiram cumprir as regras. A tarefa também foi cumprida por agremiações que jamais mereceram espaços comparáveis na mídia, como o PPL, o Solidariedade e o PROS.
Mas a pauta se manteve com a adesão de Marina ao PSB. Logo se somou as avaliações dos dois nomes nas pesquisas e o casamento foi saudado como uma grande nova: ficou menos insofismável a liderança de Dilma Rousseff na corrida sucessória.
Marina encontrara um caminho para viabilizar sua participação no processo eleitoral. É nítido que o ódio move sua inabalável determinação de confrontar-se com Dilma, no que os psicanalistas poderiam ver a tentativa de resolver o trauma de não ter conseguido conquistar a condição de favorita de Lula no curso de seu governo. A sensação de força decorrente de seus quase 20 milhões de votos de 2010 e das atuais intenções de votos manteriam ativo esse ódio subjacente à motivação política. O suficiente para que se torne personagem mais confiavelmente anti-Dilma que seu anfitrião, o governador pernambucano Eduardo Campos.
Mas a política não é assim tão simples: a mera soma dos dois índices. Soma que viabilizaria um segundo turno e, nele, a desejada batalha definitiva entre ela e Aécio Neves, que lideraria, ainda segundo o devaneio uma grande frente contra o PT. Análises mais detidas começam a surgir.
Não a Rede, mas Marina incorpora realmente musculatura ao PSB por seu peso eleitoral. Só dá pra chegar até aí: o presumível potencial eleitoral, aferido por sua última votação para a Presidência e confirmado por sucessivos levantamentos de intenção de voto, em que ela oscila percentualmente, mas sempre se situa em segundo lugar entre os postulantes possíveis. Não é necessariamente verdade que seus eleitorais a acompanhariam numa dobradinha em que o candidato a presidente seria outro, no caso Eduardo Campos, com ela vinculada ao PSB, mesmo após manifestar reiteradamente a sua aversão a todo o elenco de partidos brasileiros.
Os protestos nas redes sociais não foram poucos. Houve manifestações contrárias no próprio ambiente da Rede. Não escapou à observação dos até então embriagados com a sua proposta de novidade na vida política a forma como se deu a sua decisão. Marina comunicou-a ao presidente do PSB, pedindo ingresso em seu partido e oferecendo-lhe apoio e, só depois informou disso a sua base e, mais, deixando claro que não recuaria. Forma bem tradicional de fazer política. Deve também ter soado estranho a muitos a própria opção pelo PSB, que acabara de receber em suas fileiras – com pompa, circunstância e poder – ninguém menos que Heráclito Fortes e Jorge Bornhausen, figuras tão marcadamente identificadas com posições conservadoras e práticas políticas viciadas.
Sua entrada no PSB não pode ser vista como tranquila. Traz o risco de futura desagregação, pois representa a sujeição do seu principal líder, um nome com índice de potencial eleitoral cerca de cinco vezes menor que o de Marina. E, se há um figurino com o qual Marina não convive bem, é o de personagem secundário. Se Eduardo não crescer rapidamente e ela mantiver os índices atuais, o presidente da legenda será seriamente pressionado a ceder a vaga na competição. Como ficaria a base tradicional do PSB?
Ainda mais que é inquestionável a ambiguidade entre a radicalidade da oposição dela, em que dá para perceber razões de natureza pessoal, e a moderação dele, que considera indispensável para o seu crescimento o fato de ser visto pelo eleitorado como um dos herdeiros do projeto político de Lula. Como serão os discursos do PSB e seu candidato?
Essas posturas diferenciadas são caldo de cultura mais que suficiente para dar corpo a uma luta interna, que pode ser estimulada de fora pra dentro a partir de setores ansiosos para que Dilma Roussef tenha precocemente um adversário à altura e ele não seja Aécio Neves. O PSB terá que disputar com o PSDB a condição de polo contrário. É aí que a moderação do discurso de Eduardo Campos pode sofrer desgaste interno. Não é ele o mais capaz de fazer um enfrentamento agressivo, figadal, que desafie para uma reação a ser traduzida pelo eleitorado conservador como uma indicação de quem realmente vai disputar com Dilma.
O PSDB estará buscando esse espaço e o discurso de Aécio, com o mérito da anterioridade, manterá o tom oposicionista. O problema é que Aécio terá problemas a enfrentar. Um, não vem revelando condições de decolar. Dois, tem uma disputa interna, de que se conhece bastante o tom e a forma, com José Serra, sempre disposto a substituí-la na candidatura. Três, junto ao seu partido, pode se defrontar com o clima de denúncias relativas ao Cartel do Metrô, além de eventual evidência do julgamento do mensalão mineiro. Quatro, o colocado pelo surgimento da opção Campos/Marina, uma soma de índices que lhe coloca como alternativa secundária na disputa.
É por isso que, ao atirar em Dilma, Marina parece ter acertado em Aécio. E o PSDB tem que ser rápido na reação. O partido já vem sofrendo desgastes com as denúncias e muitos já não o estão vendo como possível postulante ao poder. Não custa lembrar que, ao menos enquanto representação parlamentar na Assembleia Legislativa, a legenda desapareceu nos últimos dias no Ceará. Logo lá, onde o governador Cid Gomes abalou seriamente o PSB ao deixar suas fileiras.
Dilma está na frente e, também por estar no exercício do poder, não precisa ferroar os seus concorrentes. O mesmo raciocínio de soma de índices mostra que não foi a grande vítima da solução Campos-Marina. Seria preciso que não houvesse redistas ou marinistas decepcionados e o PSDB mantivesse o vigor para que, somados, ficasse garantido um segundo turno.
Basta-lhe não perder apoio. Amealhar os louros dos resultados de suas políticas, se forem bem sucedidas. E, quando precisar, terá a palavra de Lula (o candidato na sombra da grande maioria dos eleitores) para lembrar a identificação com ela e sugerir que precisa dar andamento aos projetos comuns.
O fato de Dilma estar na frente também lhe favorece porque isso só acirrará aquela luta entre os postulantes do PSB e do PSDB. E isso pode puxar o discurso do PSB para a direita, com possíveis perdas na sua base. Com a nova composição, a aritmética favorece o PSB no embate com os tucanos. Se não revelar força para empurrar seu índice para cima, Aécio provavelmente se verá atropelado por Serra, inquestionavelmente contundente em seus ataques a adversários, e com a virulência reforçada, agora que nada tem a perder como candidato, depois de um rosário de derrotas.
O clima é indefinido. Mas, se vítima presumível há, ela atende pelo nome de Aécio. 

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