Durante
meses, ouvimos e lemos que 12 de junho seria um dia de opróbio, que a
verdadeira brasilidade estaria no lado de fora das obras inconclusas de
estádios, multidões incapazes de se locomover nas cidades-sedes, diante da
total falta de mobilidade.
O
Brasil parecia acuado, quase todos imaginando que a menor demonstração de
interesse pela Copa seria vista pelos demais brasileiros como um sinal de
incivilidade.
Um
sentimento estranho. Viajei pelo Chile, de Santiago ao Estreito de Magalhães.
Vi mais publicidade vinculada à Copa que no Brasil! Encontrei os chilenos
vibrando com a Copa na América Latina. Torcendo para que o título fique na
região, se possível com uma final entre representantes dos seus países, a
Argentina fora, claro (eram chilenos). Sei que o mesmo sentimento se espalhou
por Venezuela, Colômbia, Equador, Bolívia, Paraguai. Argentina, por que não?
Uma latinidade construída pela genialidade de Lula, ao espalhar a competição por
doze estados, aproximando-a dos vizinhos. Uma decisão insistentemente criticada
pelos que não admitia ver os dólares do turismo distanciando-se do eixo Rio-São
Paulo.
Estádios
que não sairiam do chão foram concluídos, a maior parte em tempo de sediar a Copa
das Confederações no ano passado. Estádios cuja conclusão chegou a ser estimada
para 2038! A rede hoteleira mostrou ser capaz de abrigar o enorme fluxo
turístico, de visitantes estrangeiros e de brasileiros.
Os
estrangeiros foram chegando e decepcionando os ranzinzas ao elogiarem os
aeroportos, vários avaliando o Galeão como melhor que os europeus e os dos
Estados Unidos. Críticas de turistas e atletas visitantes foram tão raras que
uma aranha em hotel virou manchete de jornal. As obras viárias em boa parte
ficaram prontas também. Até Salvador ganhou seu metrô, uma obra que se
arrastava há 15 anos.
Como
se algo incompleto representasse alguma catástrofe. Isso ocorreu em todas as
copas em que obras foram exigidas. Na da Alemanha por pouco não se tinha que
interromper o jogo de nossa seleção diante da quantidade de água que vazava
pela cobertura. A Notre Dame e a catedral de Barcelona ainda não estão
inteiramente prontas e recebem milhares de turistas brasileiros por ano.
Manifestantes
repetiam o mantra de mais verbas para saúde e educação, mesmo durante um
governo que é recordista histórico em investimentos nessas áreas, além de
conseguir, contra enorme resistência oposicionista, medidas legislativas
estabelecendo porcentagem mínima do PIB e direcionamento exclusivo dos recursos
do Pré-Sal. Além de criar dezenas de universidades e escolas técnicas, mais que
todos os antecessores, e assegurar a presença de médicos em praticamente todas
as cidades brasileiras.
A
cantilena dizia que Copa não é prioridade. E o que é
prioridade? Fórmula 1? Carnaval? Rock´n Rio? Festa do Divino? Festa Junina?
Procissão de Corpus Christi? Brasileirão? NBB? Luta livre? Dois de Julho?
Desfile de Sete de Setembro? Big Brother? O Boi de Parintins? A encenação de
Morada Nova? Os filmes da Globovídeo? As cavalhadas de Pirenópolis? O reveillon de Copacabana? Então nada mais
se deve fazer – coisas que me agradam e outras que detesto – que implique em
uso de recursos públicos, salvo investimentos em saúde e educação?
Nada
disso surpreende. Publiquei em meu blog sucessivas crônicas de Nelson Rodrigues
em que fica clara a irrefreável tendência da mídia nacional de malhar a seleção
nacional. É o “complexo de vira-latas”, título de uma de suas crônicas
antológicas. Acompanho futebol atentamente desde a infância, copas do mundo
desde a de 1958 (uma transmissão via rádio em que se ouvia mais descargas que
narração) e posso garantir: salvo em 1982, em que perdemos o título com um time
realmente memorável, todos os escretes canarinhos saíram daqui sob vaias
estrepitosas. E trouxemos cinco títulos. Durante eliminatória da que trouxe a
taça pela última vez, a torcida lançava bandeiras nacionais no gramado em sinal
de protesto. Entrou de mãos dadas na partida seguinte, no Recife, e aplicou 5 a
0 na Bolívia.
Desta
vez, os atletas não são vaiados. E por um motivo muito simples. Não sobraram
vaias, todas elas induzidas para as obras e a própria iniciativa de realizar a
Copa do Mundo no País.
Pois bem, já às vésperas da abertura dos jogos, vimos surgirem as primeiras manifestações de apoio à Copa e à Seleção. Timidamente no começo. Depois, em um crescendo: carros, ruas, casas, lojas, bares e restaurantes foram se cobrindo de amarelo e verde. Já não dava pra segurar. A mim, não sei se estou enganado, pareceu que alguns jornais quase que instituíram editorias separadas. À de esportes, cabia cobrir a seleção. Outra insistia em tentar ainda desqualificar o evento e tudo que a ele estivesse ligado, além de cobrir manifestações de protesto, mesmo que reunindo poucas dezenas de pessoas. A última, meio clandestina no início, ficou atribuído cobrir a expressão de adesão popular à Copa.
Pois bem, já às vésperas da abertura dos jogos, vimos surgirem as primeiras manifestações de apoio à Copa e à Seleção. Timidamente no começo. Depois, em um crescendo: carros, ruas, casas, lojas, bares e restaurantes foram se cobrindo de amarelo e verde. Já não dava pra segurar. A mim, não sei se estou enganado, pareceu que alguns jornais quase que instituíram editorias separadas. À de esportes, cabia cobrir a seleção. Outra insistia em tentar ainda desqualificar o evento e tudo que a ele estivesse ligado, além de cobrir manifestações de protesto, mesmo que reunindo poucas dezenas de pessoas. A última, meio clandestina no início, ficou atribuído cobrir a expressão de adesão popular à Copa.
A
TV ligada no restaurante em que almocei hoje mostrava uma coisa insólita. Os
repórteres cobriam preparativos para a festa de início da Copa com forçado riso
nos lábios, como que tentando convencer o público de que também a emissora
fosse adepta do evento. A âncora quase gargalhava ao falar, testando sua
habilidade cênica.
Não
importa. A seleção está em campo e o Brasil está unido com ela. Não será uma
aranha em parede de hotel que vai arranhar a festa.
Acredito
que o Brasil será hexa. Se não for, já ganhou um título e este é mais
importante. Está sediando um evento da maior importância no mundo, dando
mostras de competência tecnológica, de capacidade de realizar inúmeros e
imensos investimentos simultaneamente, ainda que sob responsabilidades
diversas, como estados, municípios e empreendedores privados. E tudo fez sem comprometer
o atendimento das maiores prioridades. E auferindo, claro, os merecidos frutos,
com o turismo dinamizando a sua economia e fixando raízes em todo o País.
O
Brasil já está em campo. A Copa nós já ganhamos. Tomara que dê também pra
ganhar o hexa.
Fernando Tolentino
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