De uma coisa se pode
ter certeza, o brasileiro sabe muito bem ler a palavra ESPERANÇA.
Este é o real sentido
das caravanas LULA PELO BRASIL, que tem o seu primeiro trecho na marcha da Bahia
ao Maranhão, atravessando todo o Nordeste.
Começou como uma boa
ideia, inspirada nas caravanas de pré-lançamento da campanha de Lula à
Presidência em 2002.
Quando realmente se
iniciou, a partir de Salvador, mostrou um potencial arrebatador que nem os seus
próprios organizadores poderiam prever. A ponto de virar alvo de oportunistas
na passagem por Feira de Santana, quando prefeitos do PMDB e do DEM – partidos que
não apoiam sequer o governo liderado pelo petista Rui Costa – enfiaram-se na
fila dos inúmeros colegas que aguardavam uma foto junto a Lula. O faro político
deixou claro para eles, como chegaram a confidenciar, que essas fotos serão peças
indispensáveis para quem quiser pedir voto no momento de renovarem os seus
mandatos, em 2020.
Qual o momento mais
tocante na trajetória de Lula na Bahia e em Sergipe? O reencontro com o jovem
Éverton, personagem de flagrante que virou a foto simbólica de sua campanha em
2002? A devolução a Lula do cartão do Bolsa Família pela jovem Iva Mayara em
Aracaju? O agradecimento do agora estudante de Medicina sergipano Magno Prado
(foto), ex-guardador de carros no Iate Clube de Aracaju? O momento em que não
resistiu e foi às lágrimas ao lembrar as perdas de Marcelo Déda, José Eduardo
Dutra e sua esposa Marisa Letícia?
O mais representativo
foi ver o “trancaço” na estrada, impedindo que a caravana prosseguisse sem que
antes Lula descesse do ônibus para falar ao povo. Foi significativo por se
tratar de uma movimentação não previamente programada pelos organizadores. Mais
ainda por mostrar que não adianta a grande mídia tentar transformá-la em uma “caravana
secreta”. Por mais incrível que possa parecer, a movimentação de Lula pelo
Nordeste só atrai a atenção da imprensa internacional, chegando a ocupar página
inteira no jornal francês Le Monde, ao mesmo tempo em que é praticamente
desconhecido por órgãos de imprensa brasileiros.
Esse episódio desmente
a apatia que vinha caracterizando atos convocados para protestar contra a perda
de direitos conquistados há décadas pelos trabalhadores do País.
A verdade é que os
brasileiros querem ter esperança. E leram isso quando Lula resolveu procurá-los
diretamente, falar para eles e mostrar que existe uma chance de virar o jogo.
O PRIMEIRO
CHOQUE DA ESQUERDA
A caravana passa. Dá
até pra dizer que enquanto os cães ladram, como reza o ditado popular. Ao tempo
em que junta multidões e Lula leva jovens e idosos às lágrimas com a emoção de encontrá-lo,
o prefeito de São Paulo abandona suas obrigações na capital paulista à cata de
holofotes em reuniões com grupos de empresários e políticos do Nordeste.
Mas as andanças de Lula
acabariam por arrepiar a esquerda na sua chegada a Alagoas. Ali, encontraria a
lhe esperar ninguém menos que o senador Renan Calheiros, do PMDB. Não bastante,
era também aguardado pela senadora Kátia Abreu, a quem Lula recepcionou com a
promessa de apoio à sua candidatura ao governo de Tocantins.
Alguém
chamou Renan ou Kátia de esquerda?!
Renan
é um político de trajetória oscilante, originando-se nas margens da esquerda, apoiando
declaradamente o também alagoano Fernando Collor desde a sua candidatura até o
mandato e integrando o ministério de Fernando Henrique Cardoso. O senador
apoiou Lula na maior parte de seus dois governos, o que voltou a ocorrer com
Dilma Rousseff. No episódio do “impeachment”, não se pode dizer que tenha sido
um golpista eufórico, até por seu conhecido antagonismo com o então presidente
da Câmara Eduardo Cunha. Nada disso torna Calheiros um político menos polêmico,
acusado de corrupção em diversos processos. Tão questionado que o silêncio da
grande imprensa do Sudeste sobre a caravana de Lula foi momentaneamente rompido
para noticiar o encontro.
Kátia
Abreu é uma política de notório distanciamento ideológico com relação ao PT.
Liderança ruralista, chegou a presidir a poderosa Confederação da Agricultura e
Pecuária do Brasil (CNA). Teve os seus primeiros mandatos pelo PFL e DEM e foi
forte crítica dos dois governos de Lula e da candidatura de Dilma em 2010,
quando chegou a ser cotada para integrar a chapa de José Serra. Posteriormente,
aderiu ao governo de Dilma, tornou-se sua ministra da Agricultura e, já filiada
ao PMDB, mostrou-se sua ferrenha defensora no episódio do afastamento da
presidenta. Adiante, faria persistente oposição a Michel Temer e viria inclusive
a votar contra os suas reformas. Uma atuação tão nítida de proximidade com as
bancadas oposicionistas que foi pedida a sua expulsão do PMDB, juntamente com a
do senador paranaense Roberto Requião.
Se
não se quer aceitar a parceria de Renan ou Kátia (ou Renan e Kátia) como indicativos
de afinidades ou coerência, que seja como reveladores da força política de Lula
como o maior cabo eleitoral da atualidade. E não só no Nordeste, pois a base de
Kátia Abreu está em Tocantins, estado em que o PT não tem nenhum deputado
federal.
FINALMENTE A
EXPECTATIVA DE REAÇÃO
Certo
é que o movimento LULA PELO BRASIL não deve ser visto apenas como uma manobra
eleitoral.
Desde
que arrefeceram as manifestações pelo FORA TEMER, por DIRETAS JÁ e por NENHUM
DIREITO A MENOS, o movimento popular não tem tido grandes razões para superar a
sua quase depressão, diante da constatação de que a indignação da opinião
pública não supera a atitude de perplexidade com o poderio do presidente que se
impôs.
Manipulando
uma política de distribuição de cargos públicos e verbas parlamentares, combinada
como generosas concessões de benefícios e privilégios para grupos econômicos
que dirigem as bancadas no Congresso, Temer tem nadado de braçadas, a ponto de
frustrar o assanhamento do deputado Rodrigo Maia com o sonho de alçar-se à
Presidência com a deposição dele e demonstrar que o grupo Globo de comunicação
pode muito, mas não pode tudo, tendo que sujeitar-se à sua permanência. Tudo
isso desdenhando uma rejeição inédita na opinião pública. Só não conseguiu
ainda a certeza de aprovar a chamada reforma da Previdência, mesmo assim por requerer
o quórum privilegiado de mudança na Constituição.
Ao
lado disso, o judiciário se mostra inteiramente alinhado com o governo de
Temer, preferindo omitir-se diante de qualquer questionamento de legalidade ou
até chancelar as suas decisões.
E o que se tem diante
de tal hegemonia? Quais as armas para esgrimir com quem demonstra tamanho
poderio?
Quem primeiro soube ler
foram os detentores tradicionais dos poderes econômico e político.
As sondagens de opinião
pública permitiam observar um rumor difuso, mas aparentemente consistente: “Não
adianta, Lula vem aí.”
Essa é a primeira
leitura da reação popular diante da caravana do LULA PELO BRASIL. A rejeição ao
governo Temer está nas ruas. E é uma reação ao que se dá hoje: desemprego
crescente, perda de valor dos salários, retirada de direitos mínimos dos
trabalhadores, perspectiva concreta de perda de direitos previdenciários, falta
de recursos para a prestação de serviços públicos indispensáveis, risco de
negação ainda maior de assistência pública de saúde e educação, para não falar
de entrega e desnacionalização do patrimônio nacional. Além disso, a escandalosa
concessão de privilégios aos detentores de grandes capitais e propriedades: os
ruralistas, o setor financeiro e os grandes empresários.
O governo golpista se
propôs desde o início a tática do “fogo de saturação”, como a usada por forças
militares, intensificando de tal forma o ataque que não dá espaço para os
inimigos se reorganizarem ou tomarem fôlego para reagir. Daí porque o Congresso
nunca funcionou tanto, os parlamentares abrindo mão de períodos em que
habitualmente não permanecem em Brasília e aprovando medidas em grande profusão
e tempo recorde.
Com isso, os diferentes
grupos populares atingidos pelas medidas não conseguiram se reagrupar e opor
resistência.
O primeiro momento de
efetiva reação popular crescente e manifesta vem com o circuito de Lula pelo
Nordeste. É natural o surgimento da convergência de políticos, que têm faro
inigualável para a movimentação da opinião pública, especialmente quando
ocorrem em suas bases.
O fundamental, em cada
caso, é ter claro quem busca apenas aproveitar-se, como muitos dos prefeitos
interessados em “selfies” com Lula, quem vai efetivamente caminhar junto, até
onde vai e em que circunstâncias.
Afinal, isso pode
representar um relativo fortalecimento, ainda que eventualmente por meros
interesses eleitoreiros, da reação às medidas antipopulares do governo golpista.
Renan e Kátia podem ser uma sinalização disso. Estamos em condições de rejeitar
essas companhias?
É preciso atentar para
o que a História ensina. De qualquer dos lados, nos anos que se seguiram à
Segunda Grande Guerra, teriam os norte-americanos ou os britânicos ficado
indignados por terem vistos as tropas de seus países lutando contra os
adversários da União Soviética? Os comunistas afrontaram Stálin por ter o Exército
Vermelho combatido os inimigos da Inglaterra e dos Estados Unidos?
Quantos incriminaram o
revolucionário Luís Carlos Prestes, após 1945, ao vê-lo no mesmo campo de
Getúlio Vargas, esquecendo o destino de sua própria companheira Olga, grávida, entregue
aos nazistas?
Ao ver políticos
conservadores aproximarem-se de Lula, o indispensável não parece ser a rejeição
da companhia, mas ver se afastam-se da política de destruição de direitos do governo
golpista, das tentativas de entrega do patrimônio nacional. Ou, principalmente,
se há compromissos sendo preteridos por Lula ou pelo PT.
NENHUMA
MANOBRA
À identificação de que
crescia a preferência pelo nome de Lula e caía a sua rejeição, as forças de
direita entenderam que era preciso reagir e fazê-lo com celeridade.
São oferecidas
alternativas eleitorais que pretendem ocupar o espaço da ausência do nome de
Lula na disputa ou que experimentem crescimento suficiente para enfrentá-lo
caso não seja possível impedir que concorra.
A tática mais segura
para esses grupos ora hegemônicos é não permitir que Lula seja candidato. Não
bastaria o juiz de Curitiba oferecer a perspectiva de desgaste da figura pública
de Lula, pois ocorria justamente o contrário. Seu nome crescia ao ser agredido.
Era como se parte considerável da população percebesse que não era pessoalmente
a Lula que se queria atingir, mas à sua perspectiva de enfrentar os seus
inimigos.
Daí, entende-se como
indispensável impedir que Lula seja candidato. Veio a sua condenação em
primeira instância e a promessa de avançar nessa direção em instâncias mais
acima.
Alternativas são
maquinadas pelos alquimistas da direita. Como a implantação do parlamentarismo,
que impediria Lula de governar caso viesse a ser eleito. Como uma reforma
político que garanta uma maioria parlamentar semelhante à atual composição do
Congresso, comprometida com os grupos econômicos hegemônicos. Ou até como o
adiamento de eleições.
Para qualquer dos
casos, a reação popular tem demonstrado ser uma arma poderosa. Ainda há seis
estados para a caravana percorrer, considerado apenas o trecho nordestino. Mas
já está claro que não é simplesmente uma manifestação de simpatia ou de
gratidão. É a declaração manifesta de que o brasileiro precisa de esperança,
identificou um caminho e quer deixar claro definitivamente que ELEIÇÃO SEM LULA
É FRAUDE.
Fernando Tolentino