Passados quatro anos e mais de duzentas
postagens, acabo tomando o BLOG DE TOLENTINO como um instrumento de debate e
não apenas de reflexão ou divulgação das minhas concepções, abordagens de temas
da atualidade, propostas ou até publicidade de importantes textos de terceiros.
Agradeço a virada aos amigos que, embora não
quase nunca se sintam à vontade para registrar comentários no espaço próprio do
BLOG DE TOLENTINO, comentam pessoalmente as postagens, ligam para isso, mandam
e-meios ou registram opiniões no Facebook,
a maior parte das vezes por meio de mensagens fechadas.
Desta vez, não deu pra resistir, especialmente
diante da manifestação de uma amiga especial (embora ainda virtual), que tocou
em um aspecto crucial de minha análise deste segundo turno para governador de
Brasília, exposta no artigo DOIS MOTIVOS PARA VOTAR NULO NO DF: CRISTÓVAM E
ROLLEMBERG, publicado no domingo, 12 de outubro.
Não é uma questão simples, minha querida
amiga. Tanto que tenho ouvido posições diferentes de vários companheiros de
luta. Uma decisão tão difícil que me senti obrigado a divulgar a minha reflexão
e a decisão naquele texto.
E você introduziu uma questão nevrálgica: cidadania.
"Voto nulo ... É desistir da
cidadania ..."
Minha geração teve essa discussão em 1970,
quando o voto nulo foi pregado por organizações de esquerda e a própria UNE.
Teríamos uma eleição entre ARENA e MDB. O
partido criado para representar politicamente a ditadura e a oposição
consentida por ela. Os partidos políticos haviam sido simplesmente fechados.
Sucessivas levas de políticos perderam os seus mandatos, restando-lhes o
exílio, tal a perseguição imposta pelo regime. As regras eleitorais obedeciam à
lógica de fazer a ARENA amplamente vencedora. Só haveria eleições, vale
lembrar, para mandatos legislativos ou prefeitos de municípios com menos que
200 mil habitantes, ainda assim excluídos os que o governo livremente definiu
como “áreas de segurança nacional” e os caracterizados como estâncias
hidrominerais.
Decisão dura. Na minha Bahia, o candidato ao
Senado pelo MDB fora indicado pessoalmente pelo próprio Antonio Carlos
Magalhães, já escolhido para governador pelo regime, como vingança contra Luís
Viana Filho, que os militares impuseram como candidato da ARENA. Os que
rejeitamos a ideia do voto nulo tivemos que cavucar na nominata do MDB para
encontrar nossos candidatos a deputado estadual e federal. Não me arrependo de
colocar na urna os nomes de Chico Pinto e José Carlos Brandão. Com um pequeno
grupo de parlamentares de esquerda, Chico viria a constituir o chamado Grupo
Autêntico, que cumpriu o seu papel nos anos de Garrastazu Médici. No curso de
mandato brilhante, acabou cassado e preso, por denunciar a ditadura do Chile
quando Pinhochet visitava o Brasil.
Não tenho dúvida de ter efetivamente exercido
minha cidadania ao eleger Chico Pinto e colocar no Congresso Nacional uma das
mais brilhantes vozes a passar por ali, além de um dos mais aguerridos e
consequentes opositores do regime ditatorial.
O que esta disputa nos oferece
Essa história de vida firmou a convicção de
que eu jamais votaria nulo. Vejo que inúmeras pessoas da minha geração estão
vivendo a mesma angústia neste momento.
A perplexidade pode ser resumida em um
raciocínio simplório, mas consistente. Qualquer que seja o meu voto um dos dois
estará eleito. Não conseguirei derrotar os dois, o que seria motivo suficiente
para optar por um deles. Como um será eleito, isso se dará sem que eu exerça a
minha cidadania, interferindo no resultado.
Como vou influenciar com o meu voto? Esta é a
questão.
Derrotando o que representa a reinstalação da
corrupção desenfreada?
Condenando o Distrito Federal a quatro anos de desgoverno,
de incapacidade na gestão, de política elitista?
Sequer os grupos são distintos, como ficou claro, por sinal,
quando Rollemberg antecipou-se ao próprio PSB e declarou o seu apoio à
candidatura presidencial de Aécio.. Embora sempre eleito com votos petistas,
Rollemberg foi sempre muito próximo de Arruda. Ninguém esqueça que a Caixa de
Pandora cassou um deputado distrital da sua base: Rogério Ulisses, do PSB. O
senador eleito com ele, Reguffe, sobrinho e assessor do então senador Sérgio
Machado (PSDB-CE), foi também assessor de Arruda justamente no mandato do
fatídico caso do painel que o levou à renúncia. Depois, deputado distrital,
esquivou-se do julgamento de Arruda no escândalo da Caixa de Pandora.
Tido como guru dos dois, o senador Cristóvam Buarque jamais
levou em conta ter sido eleito pela legenda do PT e, depois, como candidato de
sua coligação. Sempre esteve entre os mais agressivos críticos dos governos de
Lula e, posteriormente, do de Dilma. Ao longo de 12 anos, foi um dos mais
íntimos e solidários da oposição.
Já na abertura da disputa de segundo turno, Rollemberg
apressou-se a declarar que não queria apoio de partidos ou grupos políticos. A
empáfia nasceu certamente no útero da adolescência fácil, pois não precisou
suar um só dia na vida, alçado ao mais alto salário das carreiras de Estado sem
precisar ler mais que um gibi, aos mais altos cargos legislativos arrastado
pela legenda do PT. Deve achar que elegê-lo não é mais que uma obrigação para o
povo brasiliense. Faz um favor dispondo-se a receber os votos.
O mais chocante é ver que seu partido não elegeu um só
deputado distrital, um único federal!
Pior que isso, terá pela frente uma Câmara Legislativa
constituída por deputados de 17 diferentes legendas: apenas três deputados da
sua coligação e os outros 21 originários de um primeiro turno em que apoiaram
Frejat ou Agnelo. Até agora, ganhou a adesão de um partido que não elegeu
qualquer deputado, o PPS.
Novo momento, novos instrumentos de luta
É verdade que um dos dois candidatos de Aécio a governador
será eleito, tenha ou não o meu voto.
Mas tenho a certeza de que o meu voto nulo será, neste
momento, a melhor maneira de exercer a minha cidadania.
Explico. Frejat e Rollemberg deixaram suficientemente claro
que não precisam de meu voto. Aliás, insistem em repetir diariamente que não o
querem, transformando o horário eleitoral em um torneio de agressividade contra
o governo de Agnelo, liderado pelo PT.
Se isso é verdade, é mais claro ainda que o PT não precisa
apoiar nenhum deles.
De um lado porque o Distrito Federal e o seu povo não
estarão melhores nesses quatro anos, se governado pelo porta-voz da corrupção
ou por seu velho amigo Nullemberg.
Por outro lado porque, mesmo tendo sua representação
parlamentar reduzida, é a força política com melhores condições de fazer
oposição ao novo governo qualquer que seja o vencedor. O PT elegeu a maior
bancada da Câmara Legislativa. Brasília não tem qualquer dúvida do que
representa a sua base social, espalhada em dezenas de sindicatos, na CUT e em
número apreciável de outras organizações populares.
Como não pode ser acusado de inconsequente, o PT tem
condições de fazer oposição e não raro impor alternativas.
Até porque o novo governo não poderá se desligar da imagem
do que foi o governo Agnelo. Manterá seus programas e dará continuidade às
realizações, curvando-se ao fato de que o governo não era o desastre que quis
apresentar na campanha? Interromperá obras, suspenderá programas e se exporá ao
clamor popular? Restará fazer alterações cosméticas para apresentar as ações do
GDF como se novidades fossem. Sob a censura da opinião pública e a cobrança do
PT, claro.
Ou seja, exercer a cidadania no processo eleitoral não se
traduz exclusivamente em tentar eleger um determinado candidato. Pode
significar a opção prévia pela oposição, desde que tendo instrumentos para
fazer isso.
E, cá entre nós, como força política organizada, só o PT tem
condições de fazer essa escolha e seguir esse caminho no Distrito Federal.
Fernando
Tolentino
Muito bom ter lido seu texto, assim não cometo um grande erro!!!
ResponderExcluirParabéns, gostei muito do que li!!
Pois é, eis a questão... Conheço muita gente neste dilema. Mas só de pensar em ter o Frejat como governador de Brasília trazendo toda família Arruda de volta me dá ânsia.
ResponderExcluirgostei da materia.
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