quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

A INCRÍVEL BATALHA EM QUE TODOS TIVERAM O QUE COMEMORAR


São Paulo (SP), Fórum Criminal da Barra Funda, 12 horas, 17.02.2016 – Todos os manifestantes pró-Lula cantam o Hino Nacional e encerram o ato de solidariedade convocado pela Frente Brasil Popular e por movimentos sociais tendo em vista a audiência, desmarcada, em que o ex-presidente e sua esposa, Marisa, prestariam depoimento diante do Ministério Público de São Paulo.
De um lado, manifestantes golpistas contabilizam o que seriam consideráveis revezes, ao menos aos olhos de analistas pouco atentos. Há menos de 24 horas, tinham como certo de que festejariam a entrada no Fórum de Lula e dona Marisa, mas foram surpreendidos, ao final da noite passada, pela decisão do Conselho Nacional do Ministério Público em que tais as irregularidades cometidas pelo procurador Cassio Conserino, a audiência foi suspensa a partir de representação do deputado Paulo Teixeira (foto acima). Era tudo que precisavam e perseguem há tempo, uma imagem de Lula como se fosse um criminoso. No caso, queriam essa moldura, Lula entrando no Fórum Criminal. Estampada nas imagens de TV, de jornais e revistas, projetavam como fixada para a população mais ignorante (não estou dizendo com menos anos de escolaridade) tal significação, que seria levada pelo menos até o pleito de 2018, passando antes pelas eleições municipais deste ano e por todos os atos favoráveis ao golpe que conseguirem realizar durante o mandato de Dilma Rousseff.
Não bastante, fizeram mais uma manifestação com números ridículos, sem conseguir escapar da comparação da mobilização favorável a Lula, apenas a alguns metros deles. Para cada um deles, era possível contar pelo menos vinte manifestantes convocados pela Frente Brasil Popular, dos movimentos sociais e partidos que se opõem firmemente ao golpe: PT, PDT, PCdoB e PCO.
Tentaram compensar essa desvantagem com linguagens denotativas. Estimulavam que os condutores de veículos buzinassem, no que obtiveram relativo êxito, o que seria de esperar numa cidade como São Paulo, em que milhões de eleitores anistiam previamente Geraldo Alkmin e o PSDB de tudo que possam fazer contra o povo e o erário. No momento, fingem não saber do escândalo da merenda. Nos anos anteriores, da falta de água. Antes, do “trensalão”. 
Levaram o boneco em que buscam fixar a imagem de presidiário em Lula. Mais uma vez, não deu certo. Usaram de um ardil: o comando do destacamento de choque da PM obteve um acordo com as lideranças dos movimentos sociais de que esses não hostilizariam os direitistas e eles não encheriam o boneco. Claro que o acordo não foi cumprido. Quando era erguido, sucessivas levas de manifestantes contra o golpe se projetaram sobre o reservado em que os direitistas eram protegidos, até que um senhor conseguiu furar o boneco. Levou umas boas porradas, mas se transformou em um dos ídolos do ato de hoje, como a estudante Manu o foi na primeira aparição do boneco e bem lembrou hoje em sua fala.

Restou a figura excêntrica da musa da pocilga, algo que não imaginaria ainda ver em minha vida, uma madame desfilando com a expressão “64 neles” nas costas da camiseta e adulterando uma bandeira brasileira. Na frente dessa camiseta, a inacreditável foto de ninguém mais, ninguém menos que ele (duvidam?!): o general João Batista Figueiredo, aquele que dizia gostar mais de cheiro de cavalo que de povo.
Mas se engana quem supõe que os golpistas tiveram apenas derrotas. Logo de início, foi possível observar que a mídia se concentrava neles. Embora o número deles fosse insignificante, ao menos 12 câmeras de TV começavam o dia voltadas para o lado em que se juntavam, à esquerda da entrada do Fórum. Já dava pra imaginar a isenção da cobertura. Como se sabe, além disso, o combustível de seus eventos é o ódio, não têm adversários, mas inimigos. O rasgo no boneco é um prejuízo material, e custos não são problemas para eles.
O importante, para eles, foi ver a tropa de choque da PM revoltada ao perceber que falhara a sua proteção ao boneco. Estive muito perto da reação dos policiais, o suficiente para ver o ânimo. Um deles, uns 20 centímetros menor que eu, chegou a se pôr nas pontas dos pés para, a pouco mais de meio metro, disparar gás de pimenta em direção ao meu rosto. Ainda passei pelo menos uns 40 minutos com os olhos ardendo, até por também estourar ao meu lado uma das bombas de gás lacrimogêneo. Não se limitavam a lançá-las na área para onde avançaram os que reagiram ao enchimento do boneco. Foram jogadas para dentro da manifestação pró-Lula, uma espécie de vingança em nome do boneco. Com cassetetes, avançavam sobre os lulistas e, muito próximo das agressões, pude perceber que procuravam atingir as cabeças e as mãos, especialmente as de quem portava celular, talvez para destruir imagens feitas na manhã de hoje. Essa violência, absolutamente despropositada, pois não havia agressividade na manifestação, entusiasmou os golpistas, que se sentiram plenamente recompensados, saindo como que vitoriosos da manifestação. Como a de um torcedor, ao ver o rival vencido por um time que não o seu.
Mas não saímos dali abatidos. Ao contrário, com ânimos redobrados para as próximas batalhas, confirmada a capacidade de mobilização, mesmo quando já se sabia que não haveria mais depoimento. Primeiro, vimos que ainda há em quem confiar no Judiciário e no Ministério Público. Segundo, tivemos assim preservada a imagem de Lula e dona Marisa, transformados em alvo da mais solerte campanha de despropositada tentativa de desmoralização desde o suicídio de Getúlio Vargas em 1954. E ainda pudemos nos divertir. Não tem preço ver o boneco deles murchar mais uma vez.
Fernando Tolentino

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