O ano de 2013 se aproximava do ocaso
quando rebentou o orgasmo simultâneo de certa mídia e seus amigos magistrados. Não
o orgasmo espontâneo, mas o que é fruto de iniciativas combinadas ou, pelo
menos, de uma conjunção de vontades tal que levaria qualquer relacionamento ao
ideal da realização suprema.
Foi assim que justamente o dia 15 de
novembro serviu para que a mais alta corte de justiça (desculpem o termo)
desdenhasse dos valores republicanos.
Uma vez condenados, tratou-se que os
petistas José Dirceu e José Genoíno, mais Delúbio Soares, fossem enviados para
o cárcere. Não pareceu interessante que cumprissem suas penas em São Paulo, cidade
em que residiam com suas famílias (Goiânia no caso de Delúbio), talvez por
algum outro detalhe não menos malévolo. Provavelmente porque ficaria ainda mais
injustificável deslocar os condenados do segmento empresarial para a capital
paulista, fazendo-os ali cumprirem as suas penas, e seria imperdível para as
câmeras de TV a cinematográfica cena de serem enfiados juntos no xadrez, os petistas
e os agenciadores dos recursos que teriam servido à “corrupção”. Ou haveria
outro motivo para que se determinasse imediato cumprimento de pena para os
políticos petistas e não para os vinculados a outros partidos?
Não deu tempo para se cumprir trâmites
burocráticos. Mas quem vai ligar para burocracia numa hora dessas? Tanto que o
titular da Vara de Execuções Penais de Brasília foi esquecido, sendo acionado
em seu lugar o substituto, por sinal filho de um dirigente brasiliense do PSDB.
Sabe-se que a mídia (ou parte dela) tomou conhecimento da ação antes mesmo das
autoridades policiais e judiciárias.
Todos devemos convir que um orgasmo
dessa envergadura não pode simplesmente ficar apenas na lembrança.
Embora ainda adviessem furtivos (mas
não menos excitantes) encontros do casal, presumia-se encerrada a relação a
partir do início do cumprimento da pena dos petistas. O componente sádico do
orgasmo não permitiria isso e se iniciou a fase onanista diante dos gestos do
parceiro.
Pretos, prostitutas e pobres perderam
a exclusividade do cumprimento de penas, passando a dividi-la com o outro “P”,
o de petistas. Mais que isso, de esquecidos da mídia foram transformados em referências e
os direitos que lhe eram antes negados (não raro suas condições carcerárias vistas
como privilégios, do tipo “casa, comida e ócio”) passaram a ser objeto de
comiseração de jornalistas subitamente ganhos para os direitos humanos. Alguns
deles (ou seus advogados, antes tidos como “portas de cadeia”) ganharam até
voz, desde para que protestarem contra os direitos atribuídos aos petistas, por
mínimos que eles sejam.
A administração carcerária foi
praticamente obrigada a revogar a decisão de que a visita aos presos da Ação Penal
470 se desse em dias distintos da dos demais presos, uma atitude que visava a
evitar o tumulto advindo das presenças simultâneas de autoridades.
Garimpa-se um preso tetraplégico (que
jamais foi lembrado por qualquer que fosse o meio de comunicação) para comparar
com as condições de saúde de Genoíno, saído pouco antes de complicada cirurgia
cardíaca, após a qual, não bastassem os cuidados requeridos, revelou sucessivas
crises hipertensivas.
Os presos são confinados em regime
fechado, ainda que as condenações tenham sido para regime semiaberto. José
Dirceu acabou abrindo mão de emprego que lhe asseguraria o regime adequado diante
da pressão dessa mídia, inconformada com a concessão do direito. Primeiro, fez
acintosa chacota do salário oferecido. Era alto? Sim, embora aquém do de
deputado federal ou de ministro da corte que lhe condenou. De nada adiantou o
proprietário do hotel informar sobre a defasagem com relação ao de outro
gerente, esclarecendo que este recebe comissão sobre a atividade, o que não
seria o caso de Dirceu. O seu possível empregador acabou denunciado por negócios
em paraíso fiscal, como se um empregado pudesse ser culpado por atividades do
empregador. Também não adiantou a revelação de que essas atividades fossem comuns
a grupos empresariais que mantêm veículos de comunicação. O que realmente importava
era a ameaça velada a quantos arriscassem oferecer emprego ao petista. Agora,
com nova oferta e em valor muito abaixo do que o mercado lhe reservaria em
condições normais, Dirceu aguarda pacientemente que a autoridade (sob a perversa
fiscalização midiática) se digne a despachar seu processo.
Por último (por enquanto), chega a
absurda notícia de que não é autorizada à prática da leitura aos presos
petistas por mais de duas horas por dia! Aquela mídia – a mesma que tão
contritamente lembra a todos a importância de preservarem o “espírito de Natal”
– comemora mais essa decisão.
Ponho-me a imaginar que falta não deve
ter feito a Caifaz uma mídia ativa, econômica e tecnologicamente capacitada e
principalmente hegemônica. O que faria essa mídia com o Cireneu caso já existisse
no momento da agonia de Jesus e o surpreendesse levantando a sua cruz?!
Fernando Tolentino
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